Ok, eu admito. Quando soube que meu texto iria aparecer na Quattroruote (parceira italiana da MOTOR SHOW) sob o título “Adeus, piloto”, quei um pouco desconcertado e, para ser franco, ofendido. Mas, perguntei a mim mesmo, como podem convidar alguém que fez de sua vida guiar carros para dar um depoimento sobre carros que serão capazes de se guiarem sozinhos? Superado esse orgulho inicial, tipicamente humano, comecei a pensar e pesquisar sobre os carros autônomos e os projetos dos meus colegas da Mercedes – a marca, não a escuderia. 

Compreendi, então, que o desenvolvimento desse know-how automobilístico tem o objetivo de aumentar nossa segurança. Deixo para os engenheiros de Stuttgart o julgamento sobre o mpacto que o advento dos carros autônomos terá sobre o transporte em geral. Apesar de não ser especialista, posso intuir os enormes benefícios sociais que os carros-robôs podem trazer, se e quando chegarem. Teremos um mundo sem acidentes. Circularemos em ruas livres, pois computadores serão capazes de prever e evitar engarrafamentos. Consumiremos menos gasolina, enfraquecendo os laços que nos prendem aos países que a produzem. Teremos mais tempo para nossos passatempos e trabalho: enquanto um motorista invisível nos leva ao destino, poderemos assistir à tevê, navegar na internet ou brincar com as crianças. Anjos da guarda silenciosos cuidarão de nós, enquanto centrais eletrônicas dos carros trocarão dados: o único tráfego será o da autoestrada informatizada, na qual os sistemas eletrônicos irão interagir em uma Babel de bits.

Se aceitamos sem problemas que os aviões em que viajamos são monitorados por torres a milhares de quilômetros, e que voamos 99% do tempo controlados só por instrumentos, podemos fazer a mesma coisa em nossos carros, não? Nesse ponto, a pergunta que surge é: isso vai signi car a morte do motorista e, em última instância, do automobilismo – em que o homem ao volante é o centro (mesmo que alguns digam que nós, pilotos, importamos cada vez menos)? Acho que não. 

Em primeiro lugar, nosso empenho pro ssional traz enorme benefício para o desenvolvimento dos carros como um todo, como evidenciado pelas inúmeras soluções que migraram das pistas para as ruas. Turbo, injeção direta, controle de estabilidade, câmbio sequencial e regeneração de energia de frenagem são algumas das ideias nascidas nas corridas e herdadas pelos carros comuns. As competições,portanto, continuarão a ser um laboratório indispensável para os automóveis.

E a mesma coisa vale para o elemento humano. Não acho que um dia teremos monopostos correndo sem pilotos: um pouco porque, se assim zéssemos, eu acabaria desempregado, e um pouco porque, para ser mais losó co, as corridas são verdadeiras metáforas para a vida, muito mais do que um simples confronto mecânico. Combinam o desenvolvimento cientí co com o elemento humano – porque paixão e emoção nunca se desconectarão do mundo das quatro rodas.