Conta-se que um cliente alemão chegou a Maranello para encomendar uma Ferrari LaFerrari meses antes do lançamento do supercarro. Só a taxa de reserva já era de um milhão de euros. Ele foi avisado de que, infelizmente, para comprar aquele carro precisava provar já ter sido dono de pelo menos duas Ferrari. O homem não se desconcertou e encontrou a solução: comprou dois modelos de linha da marca e, com isso, conquistou o direito de ser um dos 499 proprietários dessa exclusivíssima máquina.

Verdade ou não, essa história ajuda a entender os contornos do mundo inacessível a simples mortais do qual faz parte a LaFerrari, um verdadeiro compêndio automotivo sobre rodas. O carro representa o estado da arte em aerodinâmica e design.

Sobre sua concepção mecânica, tivemos informações meses antes do lançamento – e foram comprovadas. Trata-se da primeira Ferrari híbrida da história da marca. O poderoso 12 cilindros longitudinal com potência especí ca de 128 cv/l é auxiliado por um pequeno mas potente motor elétrico de 163 cv ligado ao câmbio dupla embreagem e alimentado por baterias. Essas baterias se recarregam nas frenagens e sempre que o motor térmico produz potência em excesso. Assim, a emissão de CO2 cou limitada a 330 g/km. Por outro lado, sobre o processo criativo que levou ao modelo, pouca coisa foi dita ou mostrada. Foram muitas alternativas de estilo exploradas em dois anos de trabalho, mas, por m, a estreita ligação entre os objetivos de performance e o desenho, em uma seleção de espécie quase darwiniana, eliminou as formas menos e cientes.

Em 2010, havia pelo menos dez maquetes em escala 1:14 expostas no centro de desenvolvimento da marca. No início de 2011, apenas cinco tinham resistido aos testes e ganhado sua versão em escala natural, 1:1. Outras seleções diminuíram as opções para três, depois para duas, até chegarem ao modelo escolhido, que foi o mais e ciente, não necessariamente o que havia agradado mais. “Nos apaixonamos por algumas soluções estéticas que aparecem em vários protótipos, especialmente por uma que chamamos de manta. Os LEDs diurnos cavam no alto, destacados dos faróis, e tínhamos uma espécie de para-choque duplo. Mas tivemos de abrir mão disso porque levava a um peso extra que o carro não poderia comportar”, revelou Flávio Mantozi, diretor do centro de estilo da marca.

Enquanto, por um lado, privilegiava-se o conjunto motriz escolhido e procurava-se conter cada grama de peso possível, de outro, nas simulações computadorizadas e no túnel de vento, os engenheiros tinham um missão muito maior do que a eficiência aerodinâmica. A questão nem era tanto a de penetrar o ar, mas garantir que o modelo de 800 cv de potência ficasse bem colado ao chão e tivesse uma dinâmica irrepreensível, proporcional ao seu desempenho descomunal. “Nesse carro, podemos dizer que o desenho nasceu naturalmente do fluxo aerodinâmico. Algumas formas da carroceria existem simplesmente em função do ar que a atravessa”, conta Mantozi. Por dentro, há muita fibra de carbono e bancos fixos (feitos sob medida), além de volante e pedaleira reguláveis. Tudo em nome da redução de peso.

Quem visitar Maranello até o fim de setembro poderá ver de perto, no Museu Ferrari, todos os modelos em escala mostrados aqui e que resultaram nas linhas finais da LaFerrari. Para reservas antecipadas, acesse o site museo.ferrari.com. Não perca uma oportunidade única de observar o nascimento de um mito e de fazer parte, ainda que por poucas horas, de um universo no qual nem sempre nos é permitido entrar.