A tabela de horários mostrava: Flavio Silveira: 16h30 – 16h37. Dez horas depois de acordar, chegaria à minha apoteose. Durante cada minuto do dia esperei por esse momento. Era o último da fila. Vi colegas rodarem na primeira curva e na entrada da reta – e serem trazidos em uma minivan, frustrados. Sabia de (quase) tudo que podia dar errado.

Entro no carro e tento me acomodar. Na verdade, ali é bastante incômodo. Os pés ficam mais altos do que o quadril e mal dá para mexer braços e pernas. O macacão e o capacete tornam o calor insuportável. Sinto uma mistura de excitação, medo, ansiedade e claustrofobia. Quase pânico.

Minha experiência anterior com monopostos se resumia a uma corrida de kart – com uma costela trincada – e a duas sessões de Fórmula Renault sabiamente incluídas na programação do dia. Em carros “normais”, fiz cursos de pilotagem, e por isso conhecia os conceitos de trajetória e transferência de carga. Mas isso não aliviava nada: no fórmula tudo é bem diferente.

Hora de acelerar. Devo sair em segunda. Dão a partida e um instrutor sinaliza para eu manter o motor girando alto e tirar o pé da embreagem lentamente. O pedal é pesado e minha perna dói. Meu calcanhar esquerdo escorrega e deixo o motor morrer. Vergonha.

Segunda tentativa. Agora sim. Tenho direito a duas voltas, e o plano é não fazer nada errado até voltar à reta dos boxes. Ia poupar tudo para ela. Contorno as primeiras curvas e chego à reta oposta, a Mistral. O medo passou, e não consigo me controlar. Acelero tudo e o V10 urra acima das 10.000 rpm. Entro na Signes, a curva mais rápida, a 240 km/h.

Faço a última curva do miolo e chego à entrada da reta dos boxes. Quero sentir o po- der dos 550 cv (nossos carros eram limitados a 12.000 rpm, “perdendo” 200 cv). Afundo o pé. O vento tenta arrancar meu capacete e a reta acaba. De zero a 100 km/h, esse F1 leva 2,6 segundos. Ali, cheguei a 255 km/h.

Cumprida a missão de acelerar tudo na reta, a adrenalina me faz sair do controle. Sem o que temer, faço tudo mais rápido, com menos prudência. Me torno um irresponsável. Ainda bem que me mandam voltar aos boxes antes que faça besteira. Foi uma experiência quase indescritível. E inesquecível.