O Brasil tem duas entidades que cuidam dos interesses das montadoras de automóveis. Uma é a Anfavea, que reúne os principais fabricantes e 26 marcas em atividade, entre elas as tradicionalíssimas Chevrolet, Fiat, Ford e Volkswagen. Ela é presidida por Antonio Carlos Megale, da Volkswagen. A outra é a Abeifa, que engloba 15 marcas em atividade, entre elas algumas que apenas fazem importação, como a Kia Motors, a Ferrari, a JAC Motors e a Porsche. As chinesas que produzem carros no Brasil (Chery e Lifan) também estão na Abeifa, que é presidida por José Carlos Gandini, da Kia.

Curiosamente, algumas marcas fazem parte da Anfavea e também da Abeifa. São elas: BMW, Jaguar, Land Rover, Mini e Suzuki. As duas entidades divulgaram seus balanços de produção, vendas, exportação e importação no primeiro semestre. Do lado da Anfavea, otimismo. Do lado da Abeifa, alívio. Vamos aos porquês desse otimismo e desse alívio.

OS NÚMEROS DA ANFAVEA

A Anfavea está otimista porque os licenciamentos de veículos (automóveis de passeio, comerciais leves, caminhões e ônibus) finalmente ultrapassaram os números acumulados no mesmo período do ano passado (janeiro a junho).  Com 1,019 milhão de unidades vendidas, teve um crescimento de 3,7% em relação aos 983 mil veículos licenciados em 2016.

Das 26 marcas da Anfavea que produzem automóveis, nada menos de 12 já superaram os números da temporada anterior: Jaguar (101,8%), Jeep (53,4%), Nissan (42,2%), Lexus (21,8%), Ford (17,3%), Suzuki (17,3%), Chevrolet (9,5%), Honda (9,5%), Renault (9,1%), Mercedes-Benz (7,5%), Hyundai (5,6%) e Toyota (5,0%).

Das 16 marcas que produzem comerciais leves, apenas quatro subiram: Chevrolet (31,1%), Mercedes-Benz (13,0%), Mitsubishi (7,1%) e Fiat (5,7%). Mas Megale disse que esse dado não é muito relevante porque o mercado de comerciais leves já tinha melhorado um pouco no ano passado. “O crescimento está mais concentrado nos setores que estavam mais atrasados nessa recuperação”, explicou.

OS NÚMEROS DA ABEIFA

A Abeifa está aliviada porque “faltam apenas 175 dias para acabar o Inovar-Auto”, disse Gandini, no dia anterior. Portanto, faltam 174. Como se sabe, o programa Inovar-Auto foi uma canetada do governo Dilma que começou em 2012 e termina em 31 de dezembro de 2017, sacrificando demais o setor de importações, devido a uma sobretaxa de 30% de imposto na hora da venda do veículo. Isso sem contar os 35% do imposto de importação.

Por causa disso, os executivos da Abeifa estão contando os dias para voltar ao jogo. Antes do Inovar-Auto, em 2011, as vendas de carros importados atingiram 199,4 mil unidades. Foi caindo e chegou ao fundo do poço em 2016, com apenas 35,8 mil carros vendidos. Mas o poço era ainda mais profundo e a queda continua. A previsão da Abeifa para este ano é de esquálidos 27 mil licenciamentos.

Apenas cinco marcas da Abeifa conseguiram vender mais de mil carros importados no primeiro semestre: Kia Motors (3.937), JAC Motors (1.654), Volvo (1.551), Lifan (1.249) e Suzuki (1.217). Quanto à produção nacional, os números mais “robustos” dentro da Abeifa são os da BMW (3.338 carros) e os da Land Rover (2.215).

Para Gandini, a partir de 1º de janeiro, os carros importados finalmente poderão voltar a disputar consumidores no mercado brasileiro. O objetivo da Kia, por exemplo, é passar de 8.000 carros em 2017 para 20.000 no próximo ano. Mas nunca será como antes. “É muito difícil competir com os produtos de entrada”, explicou Gandini. “Devemos começar a brigar com SUVs a partir de R$ 130 mil para frente. Como a produção nacional melhorou muito, então vai ser difícil fazer volume.”

PRODUÇÃO E EXPORTAÇÕES

De fato, a produção interna cresceu. Segundo a Anfavea, o crescimento no primeiro semestre foi de 23,3%, batendo na casa de 1,263 milhão, contra 1,025 milhão na temporada passada. Por causa disso, a Anfavea mudou suas previsões para o volume de produção de 2017: passou de 2,413 milhões para 2,619 milhões, um avanço de 21,5%.

Existe um “viés positivo” nos licenciamentos de veículos leves (automóveis e comerciais) e um “viés negativo” nos emplacamentos de veículos pesados (caminhões e ônibus), de forma que a entidade preferiu manter (por enquanto) sua previsão de crescimento para este ano, que é de 4,0% no total.

O aumento de produção é puxado pelas importações, que registraram o melhor semestre da história, com 57,2 mil veículos vendidos para fora. Isso ajudou o Brasil, pois em dinheiro a arrecadação com exportações deverá passar de US$ 10,7 bilhões para US$ 13,9 bilhões (nova estimativa).

MARCAS E CARROS

Nesse cenário, podemos esperar as montadoras tradicionais vendendo cada vez mais veículos para outros países, o que pode melhorar a qualidade dos carros brasileiros a longo prazo, e as importadoras investindo em novos modelos. Um dos carros que finalmente sairão da geladeira é o Kia Rio. Trata-se de um hatch do porte do Hyundai HB20 que deverá estrear em março de 2018. Ele virá com motor 1.6 de 128 cv de potência. No balanço da Abeifa, Gandini revelou que a Kia também está homologando o Stinger, um cupê de quatro portas, com motor V6 biturbo de 370 cavalos.

Não é descartada também a volta de algumas marcas que partiram desiludidas do Brasil, como a chinesa Geely, a coreana SsangYong e a japonesa Mazda. Esta última, aliás, tem uma operação no México, o que poderá facilitar um eventual retorno ao Brasil. Mas, por ter entrevistado recentemente o presidente da Mazda do México, eu apostaria, por enquanto, somente na chegada de novos modelos e não de novas marcas.