A Ford se orgulha (com razão) de sua linha de motores EcoBoost, que são turbinados de alta eficiência. São sete exemplares: 1.0, 1.5, 1.6, 2.0, 2.3, 2.7 e 3.5. Por isso, tinha intenção de produzir no Brasil o 1.0 EcoBoost para substituir o 1.6 aspirado que equipa o New Fiesta e o Focus. Mas a crise econômica jogou a estratégica para as catacumbas. A Ford vem perdendo muita participação de mercado (caiu do quarto para o sexto lugar) e só o Ka tem feito grande sucesso nas vendas.

O EcoSport, que já foi imbatível, vende menos da metade que o Honda HR-V e o Jeep Renegade. E o segmento de hatches médios, que tem o Focus na vice-liderança, é o que mais perde clientes. Eles estão migrando para os sedãs, para os crossovers e para os hatches compactos. É nessa última categoria que se encaixa o Fiesta. Um carro bonito, bem resolvido e que faz enorme sucesso no mundo inteiro. Na Europa, por exemplo, é o terceiro carro mais vendido, atrás apenas dos Volkswagen Golf e Polo.

Mas no Brasil o Fiesta hatch é apenas o 36º colocado. Se somarmos as vendas do Fiesta Sedan, a situação não muda muito: a família Fiesta ocupa uma discretíssima 22ª colocada na tabela. Diante de tantas tendências, números e possibilidades, parece que a Ford perdeu a mão.

Não que o Fiesta EcoBoost seja um carro ruim. Muito pelo contrário – é o melhor da linha! Mas a estratégia que a Ford adotou para ele é estranha. Sem poder fabricar o motor 1.0 EcoBoost no Brasil, a montadora decidiu fazer um “teste de mercado”: importou-o da Romênia, onde é produzido, e anunciou que o New Fiesta 2017 possui o motor 1.0 turbo mais potente do mercado. Fato: são 125 cavalos contra 101 cv do VW Up TSI e 98 cv do Hyundai HB20.

O problema é que esse motor 1.0 turbo é muito melhor do que o atual 1.6 aspirado. Segundo o supervisor de engenharia veicular da Ford, Rafael Ramos, o Fiesta 1.0 é 20% mais rápido do que o 1.6. Ambos têm o câmbio automatizado PowerShift, de seis marchas. O consumo do Fiesta 1.0 também é melhor: ele faz 12,2 km/l na cidade e 15,3 km/l na estrada, contra 11,2 e 14,9 do Fiesta 1.6. Parece que o Fiesta EcoBoost é um carro de imagem, mas o marketing da montadora nega. Todavia, não revela qual seu volume de produção ou previsão de vendas.

Se é assim, por que comprar o 1.6? Resposta: porque a Ford não tem volume para atender a demanda do 1.0 EcoBoost, agora que o Fiesta 1.5 saiu (mais ou menos) de linha – ele continua a ser vendido apenas para frotistas (um caso inusitado). Como se sabe, os custos de importação não são baixos, daí é necessário um malabarismo de preço. Por isso, a Ford decidiu criar uma segunda versão Titanium (rebatizada de Titanium Plus), topo de linha, custando R$ 1.300 a mais que a já existente com motor 1.6. Confuso, muito confuso. E sinceramente não dá para entender a saída do Fiesta 1.5 de linha e sua permanência exclusivamente para frotistas.

Visualmente, o New Fiesta EcoBoost não tem nada que o diferencie do Titanium 1.6, que é pior (Foto: Ford)

Os novos Titanium “Plus” (que ganharam esse nome de marketing, mas não na carroceria do carro) são iguais em tudo, nas versões 1.0 e 1.6, em termos de aparência e equipamentos. A única diferença está mesmo no motor mais potente e mais ecológico. Custava colocar pelo menos uma roda diferente? Ou dar um nome único para essa versão? New Fiesta EcoBoost já não era suficiente? Se é um teste, a duplicação da versão não ajuda em nada. Óbvio que o Titanium 1.6 só ficará mesmo com aqueles consumidores muito ignorantes ou que não abrem mão do carro flex.

Na Alemanha, a oferta de motorização do Fiesta é muito mais diversificada. A versão 1.0 EcoBoost tem 100 cv com câmbio PowerShift e custa 13.890 euros, mas as outras opções são 1.2 a gasolina de 82 cv com câmbio manual (11.290 euros) e 1.5 a diesel de 95 cv também manual (13.685 euros). Na Inglaterra, o motor 1.0 EcoBoost de 125 cv é vendido apenas no Fiesta ST, que é um esportivo. As versões normais têm 100 cv e a diversidade de motores e versões é enorme. Nos Estados Unidos, o 1.0 EcoBoost está versão intermediária SE (15.620 dólares), junto com o 1.6, que equipa também as versões básica (14.390 dólares) e a Titanium (18.340 dólares). Já o EcoBoost 1.6, bem mais potente, equipa apenas o esportivo Fiesta ST (20.970 dólares).

Não é fácil ter um bom motor e não poder lançá-lo em grande escala, quando toda a concorrência já o faz. Como teste, o Fiesta EcoBoost Titanium Plus não vai acrescentar nada. Como negócio, sequer vai atrair novos compradores para o modelo. Vai, isso sim, tirar vendas do Titanium Plus 1.6. No final das contas, parece um excesso de letras, nomes, versões, que deixa o consumidor mais confuso. O bom Fiesta EcoBoost brasileiro merecia uma versão só dele. E, aqui entre nós, um preço muito mais acessível, se a ideia da Ford é atrair consumidores que estão sem fôlego financeiro para acompanhar a escalada de preços dos hatches maiores (até porque, por R$ 72 mil, a ultrapassada e minúscula tela multimídia do Fiesta Titanium “Plus” fica devendo bastante).