A apresentação de novas picapes no Salão de Detroit, onde estive na semana passada, é tão óbvia quanto uma galinha botar um ovo. E não foi diferente dessa vez, com novas versões de marcas tradicionais no segmento, como RAM, Ford, Toyota e Nissan. Outra característica dos salões de automóveis é a divulgação anterior de um press-release falando da novidade que debutará na feira. Mas este ano a Hyundai surpreendeu o mundo em Detroit, apresentando o conceito de sua primeira picape: a Santa Cruz.

Mas a Santa Cruz Crossover Truck não tem nada a ver com as picapes que conhecemos atualmente. Ela faz parte de um novo nicho, que muito em breve será inaugurado nos Estados Unidos e também no Brasil: veículos que, embora tenham uma caçamba, são na verdade automóveis com todo conforto. Para entender o que representa a Hyundai Santa Cruz, vamos fazer uma análise do mercado brasileiro.

No Brasil existem atualmente dois tipos de picapes: as pequenas, derivadas de hatches de entrada, e as médias, derivadas de SUVs. Ambas têm versões de passeio e de trabalho. O sucesso das picapinhas no Brasil é tão grande que a Fiat Strada foi o terceiro carro mais vendido em 2014, com 153.109 emplacamentos, perdendo apenas para o Fiat Palio (183.742) e para o Volkswagen Gol (183.356). Entre as médias, a mais vendida é a Chevrolet S10 (50.812 licenciamentos), ocupando a 20ª posição no ranking geral de 2014. Mas, enquanto as pequenas deixam ainda menor um carro que já é apertado, as picapes médias são feitas no sistema de carroceria sobre chassi, tipo caminhão mesmo. Essas duas categorias representam um mercado de 443.314 veículos/ano no Brasil. Não é nada desprezível.

A Hyundai Santa Cruz fará parte de um novo tipo de picape: carroceria construída em monobloco, ou seja, uma peça inteiriça na qual são instaladas as suspensões, rodas etc., como em um carro de passeio. Segundo a Hyundai, apenas 7% dos compradores das picapes atuais são jovens. Isso porque várias pessoas rejeitam o comportamento difícil desses pequenos caminhões na cidade ou mesmo na estrada. A Santa Cruz, ao contrário, além de oferecer uma dirigibilidade igual à de um automóvel, terá soluções muito inteligentes para aqueles consumidores que as montadoras chamam de “aventureiros urbanos”.

Equipada com vários itens de conforto e esportividade, a Santa Cruz Crossover Truck traz equipamentos inusitados: banco traseiro que se transforma em cama, caçamba facilmente estensível para acomodar objetos compridos, portas que se abrem em leque e apoios de pé atrás das rodas traseiras como escada para reparos em locais altos (o teto de uma varanda, por exemplo).

A Hyundai ainda não divulgou quando iniciará a produção de sua primeira picape, mas quando ela chegar, não estará sozinha. Aqui mesmo no Brasil duas montadoras desenvolvem suas inovadoras “picapes crossovers” (podemos usar esse nome): a Fiat e a Renault. O projeto da Fiat, chamado por enquanto de FFC4 (Fiat Coupé Concept 4) é parecidíssimo com o da Hyundai, inclusive nas agressivas linhas do design. Essa picape será feita na fábrica da Fiat Chrysler em Pernambuco e chegará ao mercado a partir de novembro deste ano. Enquanto isso, no Paraná, a Renault trabalha rapidamente no projeto da Oroch, que vem a ser a picape derivada do crossover Duster.

Como se vê, dessa vez nem tudo foi óbvio no Salão de Detroit. Um novo nicho está sendo aberto para mercados como Brasil, Argentina e Estados Unidos. Essas picapes serão um pouco menores do que as tradicionais Chevrolet S10 e Ford Ranger, por exemplo, mas tão confortáveis quanto um carro de passeio, algo que picapinhas como a Fiat Strada e a Volkswagen Saveiro nunca vão conseguir.