Roger Crathorne nasceu em 1947 no hospital de Solihull, Inglaterra, distante pouco mais de dois quilômetros da primeira fábrica da Land Rover, inaugurada no ano seguinte (em atividade até hoje, já produziu mais de quatro milhões de veículos). E mais: nasceu no mesmo mês em que os irmãos Wilks conceberam o primeiro veículo da marca. Finalmente, em 1947 – com apenas 16 anos de idade – Crathorne começou a trabalhar na montadora. Daí o apelido de Mr. Land Rover, adotado até pelo diretor-geral da marca, Phil Pophan.“Eu tive a sorte de saber exatamente o que eu queria – e era engenharia”, disse em entrevista exclusiva à MOTOR SHOW.

Depois de 15 anos na engenharia, ele passou à equipe de desenvolvimento e, nos anos 60, ajudou a criar o primeiro Range Rover, lançado em 1970, e organizou expedições – para o Sul do Sahara (“Fomos ameaçados por guardas armados na fronteira com o Marrocos”, lembra) e os vulcões da América Central, entre outros lugares. Estas expedições deram origem aos Camel Trophy – dos quais foi diretor – realizados entre 1980 e 2000, depois substituídos pelos programas Land Rover Experience, também criado por Crathorne, e G4 Challenge.

ROGER CRATHORNE

“Hoje reclamam do CO2. Daqui a alguns anos, vão reclamar da exploração de lítio para fazer as baterias”

Alguns anos mais tarde, retornou à engenharia, onde desenvolveu o sistema Terrain Response. “Em experiências offroad com consumidores, o erro mais comum era que eles iam rápido demais, nunca sabiam qual marcha estava engatada e para qual direção apontavam as rodas”, explicou. Lançado pela Land Rover em 2004, o sistema criado por ele mostra essas informações no painel de instrumentos, além de possibilitar ao motorista escolher o tipo de terreno e deixar o carro tomar as principais providências, facilitando sua vida.

“Mas os donos de Range Rover – hoje o luxuoso SUV usado pela rainha Elizabeth e pela popstar Madonna – precisam de toda essa capacidade off-road?”, pergunto. “A maioria dos clientes mal sai do asfalto, mas eles gostam de saber que podem, mesmo que não precisem”, responde. “E você imaginava, em 1970, que teria consumidores tão ilustres?” Ele me leva a uma salinha com sua coleção de manuais, catálogos e fotos antigas e mostra uma imagem de Ginger Baker, baterista da banda Cream. “Ele foi o precursor. Comprou um Range Rover e foi à Argélia e à Nigéria, em 1971, explorar novos horizontes.”

Sobre o ataque de ecoterroristas à uma concessionária da marca em São Paulo, reage com humor: “Eles têm inveja porque não podem comprar.” Depois, mais sério, diz: “Hoje reclamam das emissões de CO2 – daqui a alguns anos, com o avanço dos elétricos, vão reclamar das minas de exploração de lítio para fazer as baterias.” E completa: “Minha esposa também virou ‘verde’, e dirige um smart. Mas meu carro do dia a dia é um Freelander.”

Hoje Crathorne é gerente de comunicação da área técnica da marca e não pretende se aposentar tão cedo. “Não entendo quem reclama do trabalho. Nestes anos todos, jamais acordei achando ruim ter que ir trabalhar. Amo o que eu faço”, completa.

O universo de Crathorne: acima, um Discovery do Camel Trophy cruza um rio. À esquerda, o primeiro modelo da marca, de 1948, e uma adaptação para serviços ainda mais pesados. A atriz Marylin Monroe, em um ensaio de moda, ajuda a marca a construir sua glamourosa imagem

O Range Rover em que expedicionários cruzaram as Américas, em 1970, e, abaixo, as versões ambulância, três eixos e de polícia

EVOQUE: DO PASSADO PARA O FUTURO

Acima, um Range Rover duas portas da primeira geração, lançada em 1970, que Crathorne ajudou a desenvolver. Abaixo, o Range Rover Evoque, uma releitura do modelo que estará nos salões de Paris e São Paulo este ano, e será vendido no ano que vem. Crathorne se recusou a dizer (mas quase disse) que ele terá auxílio de um motor elétrico, mas parece que será mesmo um híbrido diesel/elétrico, para reduzir as emissões de CO2 que tornaram a marca uma “vilã” do aquecimento global.