14/12/2017 - 8:00
Sou o primeiro a defender a obrigatoriedade de itens de segurança e testes de colisão rigorosos para todos os carros. Mas temos que tomar cuidado com exageros como o ocorrido nos Estados Unidos no mês passado: a BMW fez um recall de todas as 29.383 unidades do elétrico i3 vendidas lá desde 2014 – e outras 1.159 nas concessionárias – e ainda interrompeu totalmente as vendas do modelo no país.
Se fosse por causa de um problema grave, ótimo. Mas o recall é bastante específico: mulheres com percentil abaixo de 5% (aquelas que fazem parte das 5% mais baixas da população) “têm um risco ligeiramente maior do que o permitido de sofrer lesões no pescoço”. Até aí tudo bem, todos devem ser protegidos, não importa a estatura. O problema é que esse risco só existiria “se o motorista não estiver usando o cinto de segurança” – e isso é permitido apenas em um estado nos EUA (New Hampshire).
Assim, pergunto: um fabricante de automóveis precisa mesmo ter todo esse custo de convocar carros nos outros 49 estados e possivelmente ter que mexer na parte estrutural do carro (a BMW diz que a solução ainda está em desenvolvimento) para garantir a segurança de um motorista que opta por não utilizar o cinto de segurança, um equipamento indispensável e obrigatório em qualquer lugar semi-civilizado – aparentemente exceto no estado de New Hampshire?
E, mesmo que a lei ali permita não usar o equipamento, todos sabem que ele é sempre indicado. Então se o motorista prefere “exercer sua liberdade de escolha”, tem que aceitar também as conseqüências dela. E isso não deve sobrecarregar-atrapalhar-contaminar o desenvolvimento e as vendas de automóveis. Afinal, por que gastar tempo e dinheiro da montadora para tornar mais seguro o uso do carro SEM o cinto de segurança?
Porque se fôssemos seguir esse exemplo, a Alemanha deveria realizar crash-tests com colisões a 250 km/h contra barreiras fixas para ver se a segurança está mesmo garantida? Afinal, lá há estradas sem limite de velocidade, onde a lei permite dirigir até mais rápido. Mas ninguém fez ou vai fazer um recall porque “em colisões com o carro trafegando acima de 300 km/h pode haver lesões um risco ligeiramente maior de lesões aos ocupantes”. Os testes são feitos em velocidades “normais”, e pronto!
Voltando ao caso do BMW i3, sugiro duas soluções para o problema. A primeira é um projeto de lei para obrigar a utilização do cinto de segurança naquele Estado (não sei por que não foi feito). A segunda, essa até mais fácil, é colar um adesivo no vidro ou no painel: “Use o cinto. Salve seu pescoço”.
Há, ainda, a anedota (verdade?) do engenheiro alemão que, observando que depois da adoção dos airbags as pessoas aumentaram a velocidade e a imprudência – e que ela cresceria junto com a segurança dos carros – teria dito: “Melhor trocar airbags por facas. Aí sim as pessoas vão dirigir com cuidado”. Fica a dica.
PS: o BMW i3 é um carrinho futurista incrível e também é vendido no Brasil (leia aqui minha avaliação). Aqui o recall não deve ser feito pois o uso do cinto é obrigatório – não há motivo para se gastar tempo com isso.