Toyota Corolla e Honda Civic talvez sejam protagonistas da maior disputa de nosso mercado. A oitava geração do Honda Civic – ou New Civic – chegou ao Brasil em 2006 e levou o sedã japonês à liderança da categoria em 2007 e 2008. O compatriota Toyota Corolla chegou à oitava geração em 2008 e recuperou o primeiro lugar. A nona geração do Civic chegou em 2012 e o levou à liderança em 2013. O Corolla chegou à nona geração em 2013 e em 2014 voltou ao topo do pódio. A décima geração do Civic chegou em 2016… e o Corolla se manteve na liderança.

Por quê? Bem, além das qualidades próprias – que não lhe faltam – talvez o Corolla deva agradecer à crise de 2012-2016 e à estratégia da Honda pela ampla vantagem na liderança. Vamos lá…

Enquanto produto, o Civic também é um ótimo sedã, e a disputa hoje é bem equilibrada, como quase sempre nesse clássico embate nipônico. 

Então alguns analistas já atribuíram o mau resultado das vendas da última geração do Honda Civic a seu design, que seria ousado demais para o consumidor brasileiro de sedãs médios. Esquecem-se que o Civic de maior sucesso por aqui foi justamente aquela “nave espacial” de 2006, ousado por dentro e por fora.

Outros falam do preço salgado. De fato era, se comparado ao Fusion (porque o Ford era um belíssimo negócio por vir do México; leia aqui) ou a outros sedãs que precisavam ter preço por não terem tanto prestígio. Se comparado ao Corolla, porém, mesmo na versão topo de linha Touring, turbinada, não era tão mais caro – não a ponto de justificar um volume tão menor nas vendas.

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Há, ainda, quem atribua a queda do Honda ao fato de sedãs estarem sendo trocados por SUVs: o cara iria comprar um Civic e saia de HR-V. Mas não é bem assim, os SUVs não estão matando os sedãs (volto a isso em um novo post). Mesmo que fosse o caso, veja de novo o gráfico com a participação dos principais sedãs médios no segmento. No caso desse indicador, mesmo que a venda desse tipo de carro tivesse encolhido a um décimo, o dado mostra, apenas entre os compradores de sedã, o percentual que prefere cada um dos modelos. O volume total não faz diferença.

Mas os verdadeiros motivos das vendas piores do Civic em relação às do Corolla parecem estar além dos produtos. Não podemos nem afirmar que o Honda – agora ultrapassado também pelo Chevrolet Cruze – venda mal (considerando seu histórico) por culpa própria. 

Por quê? Bem, a Honda ia inaugurar sua nova fábrica em Itirapina, interior de SP, no começo de 2016. Mas, em meados de 2015, com a crise se agravando e uma queda constante e persistente nas vendas de automóveis, adiou a inauguração por tempo indeterminado. Sim, a fábrica custou R$ 1 bilhão e está pronta, mas com as portas fechadas, esperando a recuperação do mercado.

Porque se os 120.000-130.000 carros/ano que a marca produz na fábrica de Sumaré (também SP) hoje são pouco para a demanda, abrir outra capaz de produzir mais 120.000 carros representaria um problema maior, caso a demanda não fosse suficiente para consumir parte significativa da produção, que justificasse a abertura e operações da fábrica e fornecedores. Assim, a decisão sustentável economicamente foi manter a fábrica fechada – e abrir só em 2019/2020.

Então desde 2012 a Honda trabalha no limite da produção em Sumaré, fazendo 120-130 mil carros/ano. Com a limitação, tem que periodicamente, de acordo com o ciclo de vida de cada produto e demanda, ajustar a fábrica, determinando qual modelo terá a produção incrementada e qual a terá reduzida. Veja na tabela abaixo como a produção se distribuiu nos últimos anos (os números são de emplacamentos; em 2015 unidades foram trazidas da Argentina como “reforço”; depois disso, o mercado de lá se recuperou e as exportações acabaram).

201720162015201420132012
HR-V47.77555.75851.155
Fit25.34728.43942.47653.68440.63438.621
Civic25.87120.85731.24152.25460.96650.487
City15.97415.42226.40524.72829.24330.905
WR-V15.353
130.320120.476151.277130.666130.843120.013

 

O que os números sugerem é que, diante das limitações de produção, a Honda teria a partir de 2015 priorizado o HR-V, lançado no início daquele ano com estrondoso sucesso – e mais importante que o Civic em termos de tendência de mercado (a moda dos SUVs) e, muito provavelmente, de lucratividade: a plataforma do HR-V é a mesma do Fit e do City, mais barata por ser mais simples e já bem mais nacionalizada do que a base mais sofisticada do Civic “X”.

Assim, há quase um ano os emplacamentos mensais do Civic têm sido praticamente idênticos, cerca de 1.900 unidades (ou 25.000 carros/ano, a média desde 2015). Uma regularidade apenas se vê em carros com limitação de oferta, e indica que a produção do sedã está sendo toda consumida (o mesmo parece ocorrer com Fit e WR-V, mas não com o HR-V, com produção de mais de 4.000 carros/mês, nem sempre emplacada no total – ali a briga é maior, com mais rivais e oscilações naturais de mercado).

Aliás, o Civic está atrás do Chevrolet Cruze em 2018 porque a Honda parou 15 dias em coletivas no fim de ano, então produziu metade. Com rotina normal, em fevereiro o Civic reassumiu – por pouco, só 139 unidades – o segundo lugar (para virar nas vendas anuais demora, mantido o ritmo). Em São Paulo, dependendo da versão, você tem que esperar um ou dois meses por um Civic.

É difícil obter um posicionamento oficial sobre o assunto. Em off, fontes da marca reconhecem que se tivessem mais produção venderiam, sim, mais unidades do Civic. Assim, enquanto a Honda não produzir mais que 2.000 Civic por mês, não veremos mais uma briga de mercado justa entre ele e o arquirrival Toyota Corolla.

Isso não é nada bom para a Honda, e não só pela tradição de seu sedã médio. Porque hoje a marca vende tudo o que produz, mas não tudo que é capaz de produzir. Está deixando de vender mais carros, de ganhar mercado, de faturar e lucrar mais. E, ainda, uma fábrica de R$ 1 bilhão parada é muito dinheiro perdido.

Mas o mercado está virando, ano passado já cresceu. Se tudo der certo, a Honda inaugura a fábrica este ano ou no começo do próximo. Podia produzir lá também um novo CR-V nacional, que, como usa a mesma plataforma do Civic, ficaria bem mais competitivo (e disponível).

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