01/09/2008 - 0:00
“O carro brasileiro nunca teve identidade própria. Desde o início, trabalhamos com o que sobra dos grandes mercados”
Já passava das 14 horas. A equipe de MOTOR SHOW estava em um posto de gasolina, onde foi marcado o encontro com o lendário designer Anísio Campos. Segundo ele, seria muito difícil chegar em sua casa sem ter alguém para nos guiar. Dono de projetos de sucesso – como o Puma DKW, o buggy Kadron e o Carcará – e hoje com 75 anos de idade, o designer mora em uma casa rústica, construída em um terreno à beira da represa Billings, em São Paulo (SP).
Nosso personagem chega para o encontro a bordo de um Fusquinha amarelo pouco conservado. Depois dos cumprimentos e apresentações, questionar sobre o curioso besouro foi inevitável. A resposta não foi direta. “Dêem uma olhada na placa dele”, disse Anísio. No lugar do local de origem do modelo lia-se a frase “Não-Me-Toque”. Após explicar que se tratava de uma cidade do Rio Grande do Sul, o veterano nos revelou que aquela inscrição foi o único motivo pelo qual comprou o carro. De acordo com ele “Não me toque” é o nome de um veículo que desenhou e que pretende montar sobre a mecânica VW daquele mesmo Fusca.
Chegando a sua casa, pudemos ver os desenhos do “Não me toque”, junto aos de outros modelos que estampam as diversas folhas de papéis sobre sua escrivaninha com vista para a represa. Um deles é o “Fora do sério”, carro de apenas dois lugares e três janelas, que esbanja esportividade e elegância em suas linhas. Mas nem todos os recentes projetos de Anísio ficam apenas no papel. Exemplo disso são os modelos 828 e 012, da montadora Óbvio, da qual Anísio é um dos sócios.
Com cerca de meio século de experiência na indústria automotiva, o designer analisa com autoridade as tendências de design atuais. Para ele, a década de 1950 é a grande raiz do design automobilístico. “Os anos 50 ainda são a grande fonte de inspiração mundial, pois foi um período muito rico em linhas e formas, em que tudo foi usado”, afirma. Segundo ele, não existem padrões de design, cada carro carrega em suas linhas características culturais e até físicas de seu país de origem. “É uma espécie de identidade da indústria de cada nação.” Aliás, essa identidade o experiente design afirma ser ausente no Brasil. “Desde o início da produção nacional, sempre trabalhamos com o que sobra dos grandes mercados. O carro brasileiro nunca teve uma identidade própria”, conclui.
Acima, Anísio mostra os desenhos do projeto “Não me Toque”, seu trabalho atual. Ao lado, o Carcará, modelo que bateu o recorde de velocidade absoluta em 1966. Um dos carros da montadora Óbvio, da qual ele é um dos sócios