01/02/2011 - 0:00
A paixão de Ettore Bugatti pela montaria é lembrada pelo desenho escolhido para a grade e para as rodas, que remetem a celas de cavalos e ferraduras. Acima, os bancos, que ficam a poucos centímetros do chão
A convite da Bugatti, acelerei o Veyron que estava exposto no Salão do Automóvel, em novembro do ano passado. Oportunidade raríssima. O Veyron é um carro único, desenvolvido para quebrar paradigmas. Quando a Volkswagen assumiu a Bugatti, em 1998, a intenção era projetar um esportivo que resgatasse o histórico de sucesso da marca em competições em décadas passadas. Por isso, desde o início de seu projeto, o foco sempre foi o motor. O objetivo era alcançar os 1.000 cv de potência e passar dos 400 km/h.
Em 2005, a marca francesa apresentou o Veyron com 1.001 cv e, em julho deste ano, a versão Super Sport, que quebrou o recorde de velocidade para um carro de produção, atingindo 431 km/h (leia na edição MS 330). Ao volante estava o piloto oficial da marca, o francês Pierre Henry Raphanel. Foi ele quem me acompanhou no test-drive realizado no interior de São Paulo.
Raphanel diz que o Veyron pode ser dócil se você quiser andar devagar. Difícil de acreditar. Por dentro, o espaço é generoso, mas esqueça bagagens. O porta-malas fica debaixo do capô e não leva mais do que uma mala pequena, isso se você dispensar a capota dobrável, que ocupa parte do bagageiro. Nesse caso, terá que torcer para não chover. No painel, um marcador indica quanto de potência está sendo usado.
Chega a hora mais esperada. Sento no lugar do motorista, ajeito os retrovisores e vejo que a visibilidade não é das melhores.
No interior, refinado e – dentro do possível – confortável, há apenas os comandos essenciais e os mostradores de fácil leitura. No centro, em destaque, fica o conta-giros. À direita dele está o velocímetro e à sua esquerda, o indicador instantâneo da potência utilizada (com marcação até 1.001 cv). As trocas de marcha são feitas por borboleta no volante
É como se você tivesse sentado no chão. Giro a ignição, e nada acontece. Raphanel me avisa que é preciso apertar um botão próximo ao câmbio. A cavalaria acorda. Tenho a impressão de que há uma turbina de avião atrás de mim.Coloco o câmbio na posição “D” e acelero um pouco. O som aumenta, parece um assovio.
Por estar a poucos centímetros do asfalto é possível sentir todas as imperfeições da estrada. Na primeira oportunidade, resolvo experimentar a fúria do motor. Pressiono o pedal até o meio do curso. A marcha desce da sétima para a segunda. O motor, que parecia assoviar, agora grita. O tranco é tão grande que minhas costas grudam no encosto do banco. Num piscar de olhos, o velocímetro já informa 180 km/h, mesmo assim, vejo que, naquele momento, estou usando apenas 200 cv de potência. Raphanel me aconselha a fazer as trocas sequenciais na próxima acelerada para evitar o tranco na coluna. Mas me lembro de que estou pilotando um carro de quase R$ 8 milhões em uma estrada comum, aberta ao trânsito e que uma chuva de verão tinha acabado de parar, deixando o asfalto molhado. O juízo fala mais alto e tiro o pé do acelerador. Não me arrisco mais.
Todo feito de materiais nobres, como fibra de carbono e titânio, o Veyron tem motor 16,4 litros com 16 cilindros em W que desenvolve 1.001 cv. Isso graças à junção de dois V8 biturbo, que, por conta da posição alinhada de sua base, compartilham do mesmo virabrequim. São 64 válvulas, quatro por cilindro. Outros destaques são o sistema de lubrificação a carter seco, semelhante ao dos carros de F-1, e, é claro, o comando de válvulas continuamente variável e controlado eletronicamente. Para administrar tanta potência, conta com transmissão manual automatizada de dupla embreagem com sete marchas e opção sequencial, que é capaz de realizar as trocas tão rapidamente que só são perceptíveis por conta do som do motor. A tração integral, também é controlada eletronicamente. Para otimizar a aerodinâmica em velocidades altas, o Veyron conta com um aerofólio que é acionado automaticamente.
Ao encomendar o carro, o cliente leva cerca de um ano para recebê-lo. Depois de cinco meses, deve ir à sede da marca, na França, para escolher os materiais de acabamento. Na entrega, passa por um treinamento com Raphanel. Além disso, a marca tem cinco técnicos, responsáveis por pequenos grupos de clientes. “São como padrinhos. Cada proprietário tem o seu e tudo que houver de errado com o carro, eles estarão à disposição para resolver”, conta Manfred Behrend, diretor de atendimento ao cliente. Todo Veyron tem um microcomputador que permite que ele seja monitorado à distância.
O plano da Bugatti era fazer 300 unidades do Veyron, que devem se esgotar no final de 2011. Behrend revela que, então, a marca se voltará para o projeto de um quatro portas e de motor dianteiro, que deve manter a potência do Veyron. “Esperamos em 2013 poder mostrar o novo Bugatti, que será diferente de qualquer outro carro existente”, diz o executivo. Segundo ele, o sucessor do Veyron será inspirado no antigo Bugatti Atlantic, que, em maio do ano passado, teve uma unidade leiloada pela bagatela de US$ 40 milhões.