Texto Flávio Silveira Reportagem Quattroruote

Por fora, o Jeep Avenger elétrico pode ser identificado só por dois pequenos logotipos na carroceria e pela ausência do cano de escape. A avaliação completa dele já demos, e pode ser condensada mais ou menos assim: é um SUV perfeito para grandes cidades, ecológico, compacto e fácil de manobrar. Fora delas, porém, é extremamente dependente de eletropostos – um problema em vários países, não só no Brasil. Prova disso é que a versão 1.2 turbo a gasolina, concebida inicialmente apenas para os países europeus onde os elétricos são pouco aceitos (como Itália e Espanha), acabou entrando nos mercados britânico, alemão e francês por importação independente! Aí a marca decidiu vendê-lo oficialmente.

Então, se o BEV (Battery Electric Vehicle) representa o que querem os políticos e os ambientalistas, os carros tradicionais, com ICE (Internal Combustion Engine) representam o que os consumidores querem – ou podem – comprar. E quais são as diferenças, do preço à dirigibilidade, passando por consumo e conforto, entre o mesmo carro nessas duas versões? Nossa parceira italiana Quattroruote testou ambos e nos ajuda a responder.

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Preços e conteúdo

O Avenger BEV está disponível na Europa só com o motor elétrico de 156 cv e uma bateria de 51 kWh. Parte de € 37.900 (ou cerca de R$ 200 mil) e chega ao equivalente a R$ 230 mil na versão avaliada, Summit. São € 13.600 a € 15.600 (R$ 75 a R$ 83 mil) a mais do que custam as mesmas configurações com o motor a gasolina de 101 cv (mas o elétrico tem itens de série, como ADAS nível 2, nem opcional no Avenger a gasolina). Isso representa 50% adicionais, o que é muito! As cabines são igualmente econômicas em materiais, porta-malas (261 litros) e espaço traseiro. A única diferença visível aparece no túnel central do BEV – que, não precisando mais abrigar a torre da caixa de câmbio, foi transformada em um poço sem fundo, que serve pra guardar objetos (que podem ser escondidos com uma capa dobrável que lembra a dos tablets).

A traseira remete ao Renegade: o jipinho seria bem recebido no Brasil, mas provavelmente não teria volume pra justificar a produção aqui (ou seria importado e caro) (Crédito: Divulgação)

Ao volante

As duas versões satisfazem tanto a quem gosta de sentar em posição elevada como a quem prefere ficar mais perto do solo, pois o banco tem ajuste amplo. Bem diante dos olhos, os painéis digitais têm informações claras e facilmente legíveis. O que muda, obviamente, são os dados apresentados. E, claro (e bastante), a experiência ao volante. Para começo de conversa, a versão a combustão é apenas manual, enquanto no elétrico, com câmbio automático, é preciso se habituar aos botões no console central: nas manobras, é necessário baixar os olhos para procurar o D, o R ou o P; uma alavanca “normal” seria mais funcional.

Em movimento, o que mais diferencia a versão elétrica é a ausência da caixa de câmbio: isso permite uma aceleração contínua e consistente (na versão a gasolina, a transmissão interrompe o torque). É um conjunto suficiente para garantir agilidade no trânsito, mas não para grudar no banco. De qualquer modo, são bons 8,8 segundos no 0-100 km/h, três de vantagem sobre a versão só a combustão. E o BEV ainda leva vantagem nas retomadas mais comuns na cidade: a de 30-60 km/h em 3a marcha é feita em 2,8 segundos no BEV e 5,3 no ICE. A única das medidas importantes no uso diário em que ficam próximos é no 0-60 km/h, quando o elétrico marca 4,5 segundos, contra 4,9 do “rival”. Não tem jeito: a versão a bateria, neste caso, tem 45 cv a mais (por uma opção da marca e pelo peso extra). E a entrega de torque imediata dos carros elétricos realmente faz diferença.

Comportamento dinâmico

Neste caso, e isso é incomum, BEV e ICE são parecidos no comportamento – pois o BEV brilha em conforto e dinâmica. As suspensões foram calibradas perfeitamente para o imperfeito asfalto urbano, e, mesmo fora dele, o elétrico mantêm um nível de conforto mais elevado, com mais silêncio ao rodar graças à ausência do ruído do motor – só aparecem os dos pneus e aerodinâmicos (ele é de 3 a 7 decibéis mais silencioso). Nas curvas, por ser 350 quilos mais pesado, o Avenger a bateria mostrou uma pequena desvantagem em equilíbrio e estabilidade. E as frenagens são piores (seis metros adicionais, ou 10% extras, a 130 km/h). Em desvios de trajetória, também se saiu pior, apesar da distribuição de peso melhor (55/45% ante 61-39%).

Consumo e autonomia

Agora, dois fatores importantes: a eficiência e o custo de uso. Na cidade e em estradas (70 a 90 km/h), o BEV fez boas marcas de 6 a 7 km/kWh (quase 400 quilômetros sem recarga). Mas gastou muito acima de 110 km/h, com médias abaixo de 4 km/kWh (chegando a, se muito, 200 quilômetros até precisar ser carregado, e isso leva 30 minutos em eletropostos de 100 kW). Já a opção a combustão tem o motor 1.2 da PSA (aqui trocado pelo 1.3 da Fiat), com consumo surpreendente: 16,6 km/l com gasolina (pura) na cidade, 19,6 km/l em estradas (a 90 km/h) e 14,2 km/l em rodovias (120 km/h). As médias finais foram: 5,3 km/kWh no BEV e 16,1 km/l no ICE. Este último tem autonomia, então, de quase 700 quilômetros (130 km/h) ou 900, a 100 km/h – e “recarrega” em dois minutos, em qualquer posto.

Na Itália, tais resultados de consumo significam um custo por quilômetro (em valores convertidos diretamente) de R$ 0,25 no BEV carregado em casa, sem ajuda solar, subindo a cerca de R$ 1 nos eletropostos DC (bem caros por lá) e a R$ 0,62 na versão a gasolina (no caso, com um motor moderno e muito econômico). Mas, como vimos, as necessidades e as possibilidades de recarga variam muito, e os custos também. Considerando o custo do quilowatt-hora em São Paulo, os valores ficariam em R$ 0,18 (em casa) a R$ 0,45 (na rua) para o BEV, contra algo na faixa de ainda atraentes R$ 0,30 a R$ 0,35 por quilômetro no econômico Jeep Avenger a gasolina.

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No fim das contas, na maioria dos casos (como neste do Avenger), para quem costuma rodar distâncias dentro da média – algo na faixa de 15.000 quilômetros anuais – a economia ao abastecer pode não compensar o que se paga a mais pelo elétrico na hora da compra. Então, não vale a pena – do ponto de vista econômico, sem pensar nas questões ambientais, na isenção de rodízio de veículos, em eventuais descontos ou isenção de IPVA…

De qualquer modo, a diferença de valores entre as tecnologias é grande e pode demorar a ser compensada. Além disso, o valor do seguro de carros elétricos é alto e locadoras de carros em todo o mundo estão reclamando da desvalorização maior, pelo receio que as pessoas têm de comprar elétricos usados (e também pela guerra de preços entre a Tesla e BYD). Já a questão da manutenção é polêmica. “Nosso” Audi Q4 e-tron surpreendeu positivamente. Mas, segundo o CEO da Hertz, a Tesla demora a fornecer peças de reposição, e a custos muito altos. Isso para não falar dos transtornos de depender dos eletropostos…