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A noite, para ser totalmente honesto, poderia ter sido evitada. Porque poderíamos muito bem dirigir seis horas entre uma manhã e uma tarde. Mas a escuridão tinha seu propósito: amplificar as emoções, tornando mais difícil uma tarefa que já não parecia nada fácil. E também trazer ainda mais adrenalina a algo que partia de uma premissa simplesmente fantástica: testar o mais poderoso e extremo dos Porsche 911, que estreia no Brasil ainda neste semestre por algo e torno de R$ 1,8 milhão e é simplesmente o carro mais rápido deste Salão de São Paulo (pelo menos em Nürburgring, o circuito mais famoso do mundo).

Setecentos cavalos: só falar isso já tem certo efeito. Mas, para descobrir todas as suas virtudes, devemos também pesá-los, por assim dizer. Especialmente porque são os 700 cv de um GT2 RS muito particular. Único. É exatamente o mesmo carro que, no circuito de Nürburgring, marcou 6min47s, superando por longuíssimos e inacreditáveis 5 segundos o campeão até então (o famoso Lamborghini Huracán Performante) e colocando-se no topo do “hall da fama” do circuito mais incrível do mundo (edit: depois de publicada essa edição, um Lambo Aventador  LP 770-4 Superveloce Jota adaptado bateu o recorde do Porsche). Sim, é ele mesmo em nossa pista de Vairano: dê um google para acreditar, o vídeo com sua volta está bombando na internet. E a singularidade da placa GT2 RS BB EM 4202 nos levou a pensar em algo diferente: uma “6 horas” em nosso pequeno “inferno verde” na Itália, onde os pilotos de testes e a equipe editorial de nossa parceira Quattroruote se revezaram ao volante.

 

 

O TESTE

Tudo começa às 19h de uma quinta-feira do final de maio, com turnos de cerca de uma hora, sem contar as eventuais paradas técnicas, principalmente para reabastecimento. São 20h05 e chega minha vez. Recebo o carro do diretor de prova, que foi quem começou o teste. Não escondo que, antes e depois de sua “rodada”, fiquei preocupado: temia que a veemência com que partira, junto com seu amor irreprimível pelas cruzetas, pudesse ter efeitos prejudiciais sobre os pneus do 911. Mas não, basta uma rápida olhada para o carro para ver que ainda está perfeito. Enquanto me passa o volante, vejo as marcas do cinto de segurança de seis pontos em sua camisa e deduzo que será mesmo uma pilotagem infernal, de todos os pontos de vista.

Para eliminar peso, não há sistema multimídia nem mesmo ar-condicionado: do primeiro, para dizer a verdade, não senti falta, mas do segundo sim. Por poucos minutos, na verdade, porque assim que você encontra o ritmo e se concentra, esquece tudo sem relação direta e primária com se manter no asfalto, que, enlouquecido, gira em torno de você. Além disso, assumo o volante na pior hora: o crepúsculo, quando a luz muda a cada minuto e as referências se perdem a cada volta.

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Sigo em ritmo definido, que foi decidido ainda no período de reconhecimento da pista. O ideal é cravar 1min37s, menos que o 1min33s de que o GT2 RS é capaz. Seu potencial tem que ser gerenciado, não se pode rodar centenas de voltas tirando tudo do carro. O que, afinal, é também feito em corridas reais, porque mesmo com um F1 ou um LMP1 em Le Mans é impensável trabalhar sempre no limite. E esse teste pode não ser uma corrida, mas é gerenciado como uma.

Mas no 911 GT2 RS você nunca é obrigado a mostrar habilidades de piloto: toda a mecânica parece ter sido pensada para tranquilizá-lo. Todos os componentes transbordam eficácia. O flat six (seis cilindros em linha) é fora do comum: aqui trabalha sempre entre 4.000 e 7.000 rpm, sem nunca entregar menos que sua força total (76,3 kgfm!). O melhor teste de si mesmo se dá na reta, quando se pode afrouxar a concentração. O que, para mim, quase sempre significa pensar como é inacreditável estar no carro da gravação de Nürburgring.

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Um mero microssegundo depois é hora de atacar os freios, reduzindo de 245 km/h para os 170 km/h necessários para a tomada do laço Norte, atacando as curvas da área de Handling. Sim, handling (capacidade de manter-se sobre controle), que se você escrever com letra minúscula começa a divagar novamente sobre o GT2 RS e sua habilidade magistral de fazer conversarem uma frente que sempre morde forte e uma traseira que desliza quando e quanto você quiser.

A “curva de dificuldade” só aumenta se você decidir fazer a volta na referência de 1min33s, apenas para ver o efeito que causa e para entender onde, precisamente, suas habilidades terminam. Para dançar em torno do limite de um carro como esse, você precisa de muito mais do que simplesmente dirigir. Luz de reserva acesa: o tempo voou. Freios e pneus ainda parecem perfeitos, só precisará abastecer. Me consolo pensando que vou pilotar de novo mais tarde. Será uma noite infernal – e deliciosa.


Nunca tantos cavalos. E atrás

Os 911 mais poderoso e rápido da história é baseado na versão biturbo do motor 3.8 boxer seis cilindros, nascido em 2009, quando desenvolvia 500 cv: já eram muitos, e agora são 700! (com 76,4 kgfm). Para chegar a isso, foram adotados turbos maiores, sempre com geometria variável (a Porsche foi a primeira a usá-los em um motor a gasolina, onde a temperatura do gás de escape é maior), e novos pistões que reduzem a taxa de compressão, diminuindo o risco de detonação, enquanto dutos de escape aumentam a eficiência volumétrica.

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Para manter elevada a quantidade de ar que entra (e, portanto, a potência) mesmo em condições extremas, os intercoolers são resfriados por jatos de água destilada, que reduzem a temperatura em cerca de 20o C. O sistema intervém apenas quando o ar de admissão está acima de 50o C, o acelerador é pressionado em mais de 90% do curso e o motor está acima de 3.000 rpm. A transmissão automatizada de dupla embreagem PDK tem opção de gerenciamento específico para uso em pista, bem como capacidade de abrir instantaneamente as embreagens (interrompendo o fluxo de potência) quando se puxam as duas aletas no volante simultaneamente. Assim, o piloto pode intervir no comportamento do carro, limitando o subesterço ou causando sobresterço.

Para garantir máxima precisão de direção, todas as buchas de conexão são substituídas por juntas esféricas, novidade na Porsche. Os suportes do motor são ativos – alteram amortecimento conforme as condições: fica mais rígido quando há alta aceleração transversal e longitudinal. A aerodinâmica visa garantir o melhor compromisso entre arrasto e downforce (efeito solo): são 340 kg a 340 km/h, que podem subir a 450 kg com a asa na posição mais extrema.


Uma volta espetacular

Um tempo extraordinário, que o coroa como nova rei de Vairano. Mérito dos cavalos, do chassi, dos freios. Mas também dos pneus, que lhes garantem uma aderência (grip) que é a nova referência do segmento esportivo. Há um segredo que só revelamos agora: para o GT2 RS nem tudo começou com a maratona noturna. Antes, o rei de Nürburgring já havia sido testado no Handling e feito a volta rápida. Seu problema inicial era o Lambo Huracán Performante, que desde outubro estava firme no topo do ranking. E a suspeita era de que poderia dormir em paz, porque o tempo que marcou foi extraordinário.

Para testador e máquina se entenderem bem, começamos com os pneus oficiais (mas não novos) e o tempo ficou em torno de 1min11s – com comportamento que, por vezes, passa de reativo a imprevisível e um eixo traseiro que em várias ocasiões ampliar a trajetória e reduz o ritmo. Era como se dissesse que o Performante, seria duro de bater, mesmo com pneus novos e mais tentativas. Foi precisamente a troca de pneus, substituídos pelos Michelin Pilot Sport Cup 2 R,que fez enorme diferença.

A partir daí, o GT2 RS teve tudo para levar para casa o recorde, com o testador incrédulo, fazendo coisas que antes eram impossíveis. A estratosférica aderência dura uma volta, duas no máximo, e o comportamento é perfeito: rápido, o GT2 se fixa nas quatro rodas, lento solta ligeiramente a traseira, ​​permitindo velocidades muito altas. O resto é potência do motor, extraordinários freios e relações de câmbio que, só então, graças às velocidades mais altas permitidas pelos pneus, se encaixaram perfeitamente na nossa pista.


Ficha técnica:

Porsche 911 GT2 RS

Preço na Europa: R$ 1.414.000 (€ 293.732)
Carro Brasil (estimado): R$ 1.700.000
Motor: 6 cilindros contrapostos (boxer) 3.8, 24V, duplo comando variável, biturbo (geometria variável), injeção direta, intercooler
Cilindrada: 3800 cm³
Combustível: gasolina
Potência: 700 cv a 7.000 rpm
Torque: 76,4 kgfm de 2.500 rpm a 4.500 rpm
Câmbio: automatizado de dupla embreagem, sete marchas
Direção: elétrica
Suspensões: MacPherson (d) e multilink (t), amortecedores ajustáveis
Freios: discos de carbocerâmica (d/t)
Tração: traseira, diferencial autoblocante pneumático
Dimensões: 4,549 m (c), 1,880 m (l), 1,297 m (a)
Entre-eixos: 2,453 m
Pneus: 265/35 ZR20 (d) e 325/30 ZR21 (t)
Porta-malas: 115 litros
Tanque: 64 litros
Peso: 1.545 kg
0-100 km/h: 2s6 (QRT) e 2s8 (oficial)
0-160 km/h: 5s4 (QRT) e 5s8 (oficial)
0-200 km/h: 8s1 (QRT)
Vel. máxima: 335,3 km/h (QRT) / 340 km/h (oficial)
Consumo cidade: 5,5 km/l (Europa)
Consumo estrada: 12,2 km/l (Europa)
Emissão de CO²: 269 g/km (estimado)
Nota de consumo: G (Europa)