Por  Flávio Silveira

Quando avaliamos a nova geração do Dacia Stepway europeu aqui na MOTOR SHOW, dissemos: “Torça pra Renault trazer ao Brasil”. Pois é, ela enfim o trouxe – mas não exatamente. Porque acaba de lançar oficialmente este novo Kardian, que é bem mais que o novo Dacia Stepway maquiado como Renault, do modo que acontecia antes. Com a palavra, o responsável pela nova plataforma do carro, Antonio Fleischmann: “Não tem nada em comum com o Dacia Stepway.” Não que houvesse vergonha nisso, pois o romeno melhorou muito ao trocar da plataforma B0 pela CMF-B (o novo Sandero, base dele, não foi o segundo carro mais vendido da Europa em 2023 só por ser barato, mas por ter ótimo custo-benefício, como sempre: evoluiu sem ficar proporcionalmente tão mais caro).

Mas, voltemos à estrela desta avaliação, o Kardian: a novidade se afasta bem mais do Stepway europeu do que antes.
• De fato, a começar pelo design ousado, criativo e único, não compartilha com ele quase nada.
• Tem um novo 1.0 turbo nacional, desenvolvido a partir do 1.3 turbo do Duster;
 oferece câmbio de dupla embreagem, enquanto o europeu tem CVT;
 mesmo nas partes em que são muito parecidos, não são exatamente iguais.

Fleischmann diz que esta nova arquitetura, batizada de RGMP (sigla em inglês para Plataforma Modular do Grupo Renault), é uma evolução da CMF-B, e que será implantada também na Europa. Aqui, servirá de base para ao menos oito novos produtos das categorias compacta e média, incluindo as novas gerações de Duster e Oroch.

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Fórmula aprimorada

A fórmula, basicamente, é a mesma dos rivais Fiat Pulse e VW Nivus (além dos antigos Honda WR-V e Chery Tiggo 3X). Na verdade, todos, no fundo, são evoluções de “aventureiros” como VW CrossFox, Fiat Palio Adventure e o próprio Renault Sandero – que ganhavam adereços como estepes na tampa traseira, protetores de para-choques e caixas de rodas e, em boa parte deles, suspensões elevadas e/ou reforçadas e modificadas para aguentarem pisos ruins e estradas de terra. Depois, as modificações se aprofundaram: ganharam capô mais alto e/ou novas grades e faróis e/ou lanternas modificadas… Até chegarmos ao Kardian.

De fato, o novo Renault se diferencia bem mais dos hatches, e se encaixa nesse novo mais flexível conceito de SUV compacto. Afinal, se o mercado diz que Pulse, Nivus – e até Stepway – são SUVs…

A fórmula se explica e se justifica também pelo posicionamento, o mesmo dos antigos aventureiros. São carros pra quem precisa de uma suspensão mais alta e resistente, ou gosta do estilo, ou de se sentar mais no alto, mas não tem ou não quer gastar o valor de um SUV “de verdade”.

Nos preços, o Kardian também navega entre hatches e SUVs:
 parte de R$ 112.790 na versão Evolution, que já tem modo ECO, seis airbags, câmera de ré e ar automático, entre outros itens;
• vai a R$ 122.990 na Techno, que agrega equipamentos como rodas de liga, chave presencial e sistema anticolisão,
 e a R$ 132.790 na Première Edition avaliada, com câmeras 360o, ACC e monitor de ponto-cego, além de seletor de modos de condução e incrementos no visual e na cabine, como a iluminação com LEDs (mas faltou retrovisor eletrocrômico).

Dever cumprido

Se um dos deveres de uma marca é escutar o público e a crítica, a Renault merece os parabéns: o Kardian, em seu inevitável papel de “substituto” do Stepway, mantém qualidades que fizeram o sucesso dele – como espaço acima da média, robustez e confiabilidade – e, ao mesmo tempo, corrige falhas do antecessor, a começar pela cabine.

Não que o acabamento aqui seja excepcional: ainda abusa de plástico duro, porém isso virou regra até em modelos mais caros. Mas os materiais melhoraram e, a partir do Kardian Techno, volante e partes do painel e das portas têm acabamento mais macio, além de um console elevado que dá um ar mais chique e acomoda comandos do câmbio “e-shifter” e do freio de estacionamento elétrico – com acionamento e liberação automáticos, mas sem auto-hold no freio de serviço.

Já em conectividade, o Kardian também capricha: o sistema multimídia, que também era alvo de críticas – embora tenha sido um dos pioneiros e fosse até “ok” de usar, ele já estava bastante ultrapassado e devia algumas funções extras e uma tela maior e melhor. Pois bem, o novo tem central com conectividade total sem fio, tela de 8” com mais brilho e melhor resolução, além de menus mais fáceis.

Mas é ao volante que desaparecem quaisquer vestígios do velho Stepway. Se havia uma expressão que não se aplicava a ele era “prazer ao volante” – justamente um dos destaques do Kardian, como conferi em 300 quilômetros no Rio Grande do Sul, entre estradinhas de terra e cascalho na pacata Gramado e a movimentada capital Porto Alegre.

• Ao ajustar a coluna de direção, o volante “despenca” – mas ao menos fica mais vertical do que antes e tem ajustes amplos.
• Com a ajuda do banco regulável em altura, logo acho uma boa posição de dirigir (no Stepway, é tarefa difícil).
 Sem entrar em detalhes técnicos, o motor 1.0 é moderno, uma versão três cilindros do 1.3 turbo de Duster e Mercedes A200 (desenvolvido em conjunto pelas marcas). Tem um cilindro a menos, mas mantém turbo, injeção direta, duplo comando variável e outras tecnologias.
 São até 125 cv e 220 Nm, em linha com os rivais, e, como o câmbio de seis marchas prioriza o uso urbano – onde é mais econômico que eles (9 km/l com etanol e 13,1 com gasolina no PBEV), ao custo de gastar um mais na estrada (9,7 e 13,9 km/l).
 Na prática, com gasolina, fiz 12 km/l na cidade e 13,5 na estrada – isso testando as retomadas, em serras e com trânsito. Um resultado muito bom.

 

(Divulgação)

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Há sempre quadro de instrumentos digital, enquanto o console central é elevado a partir do Techno. A central multimídia com conectividade sem fio, e o console central com os comandos físicos do freio de mão eletrônico, do ar-condicionado automático, além da alanca de câmbio do tipo “e-shifter”. Abaixo, o porta-malas e a roda em detalhe


É surpreendente como tudo ficou bem acertado: como todo 1.0 turbo, garante arrancadas vigorosas (e sem lag), com alguma vibração, como todo três cilindros, e um ronquinho que é até gostoso, com um toque esportivo.

É bem ajudado pelo câmbio de dupla embreagem banhado a óleo rápido nas trocas, sempre feitas de modo precoce para aproveitar o turbo e poupar combustível – mas podem ser atrasadas no modo Sport. Se preferir, pode utilizar as aletas junto ao volante pra fazer interferências pontuais (ou, segurando uma delas, ativar o modo manual).

De qualquer modo, o SUV embala bem em velocidades médias e intermediárias, só perdendo fôlego acima de 120/130 km/h.

A suspensão é outro ponto de destaque, com bom compromisso entre firmeza e conforto: inclina um pouco nas curvas, o que é natural, considerando os ótimos 21 cm de vão livre do solo (que evita raspadas em valetas ou no off-road leve), mas a estabilidade é surpreendentemente boa.

Enfim, dentro da proposta, é um carro bem gostoso de dirigir, que passa segurança ao motorista. Dentro de sua categoria, certamente tem qualidades para incomodar a concorrência.

(Divulgação)
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Renault Kardian Première Edition

Preço básico R$ 112.790
Carro avaliado R$ 132.790

Motor: três cilindros em linha 1.0, 12V, duplo comando com variação na admissão e no escape, turbo, injeção direta Combustível: flex
Potência: 125 cv (e) e 120 cv (g) a 5.000 rpm
Torque: 220 Nm a 2.250 rpm (e) e 200 Nm a 2.000 rpm (g)
Câmbio: automatizado, dupla embreagem banhada em óleo, seis marchas, trocas sequenciais
Direção: elétrica
Suspensões: MacPherson (d) e eixo de torção (t)
Freios: disco ventilado (d) e tambor (t)
Tração: dianteira
Dimensões: 4,119 m (c), 1,747 m (l), 1,544 m (a)
Entre-eixos: 2,604 m
Pneus: 205/55 R17
Porta-malas: 358 litros
Peso: 1.186 kg
Tanque: 50 litros
0-100 km/h: 9s9 (e) e 10s7 (g)
Velocidade máxima: 180 km/h (limitada)
Consumo na cidade: 9,0 km/l (e) e 13,1 km/l (g)
Consumo na estrada: 9,7 km/l (e) e 13,9 km/l (g)
Nota do Inmetro: C
Classificação na categoria: B (SUV Compacto)