Por Flávio Silveira, enviado especial a Newport Beach (EUA)

Era para ser uma virada de página, mas nem sempre a história se desenrola como planejado: a sucessão do “rei nórdico” XC90 estava próxima, mas o mundo não está preparado, ao menos ainda, para viver sem ele. Em meio a dúvidas sobre o avanço das vendas dos automóveis elétricos e sobre as leis que regem a sua substituição, a Volvo reescreveu esse capítulo da história. Então, em vez de suceder o XC90 híbrido, sua nova “versão” para o mundo dos carros 100% elétricos, o EX90, dividirá com ele o “trono” (a posição de flagship da marca). Essa reviravolta foi anunciada justo quando o novato estreou – e teoricamente assumiria o poder –, na Califórnia, onde reina a Tesla e avaliamos o novo SUV de luxo sueco .

Falando em Tesla, a Volvo não foi a única a mudar os planos para seus elétricos recentemente.
● Ameaçada pela BYD, a marca de Elon Musk entrou em uma guerra de preços que desvalorizou ainda mais seus carros e ajudou a reforçar a alta perda de valor dos BEVs.
● Volkswagen, GM e outras marcas também andaram revendo seus planos olhando com mais atenção para os híbridos.
● De qualquer modo, voltando ao EX90, para encarar BMW X7, Mercedes-Benz GLS, Ranger Rover e cia., ele aposta, como o XC90, em luxo, tecnologia e conforto – além de um nível de segurança imbatível, honrando a tradição da marca.

Para lembrar essa tradição, um easter egg aparece na fivela do cinto de segurança: a inscrição “Since 1951”, referência ao ano em que a Volvo lançou o primeiro carro com o dispositivo. Anunciado como “o Volvo mais seguro até hoje” – e não podia ser diferente, sendo o mais novo e estando no topo da gama –, obviamente ele tem todos os sistemas de segurança já conhecidos da fabricante, como a câmera que monitora o olhar do motorista para repreendê-lo caso tire os olhos da estrada.

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Apesar de ter, literalmente, teto de vidro, o EX90 aguentou bem o calor de mais de 40 graus – mas não faria mal oferecer uma cobertura retrátil elétrica para suportar o sol e a luminosidade de um país tropical. A cabine é extremamente luxuosa e repleta de equipamentos e amplos compartimentos, como em um bom modelo para a família, e o design faz com que o painel todo pareça flutuar. Mas, em termos de praticidade de uso, algumas “evoluções de design” parecem um tanto sem sentido (Crédito:Divulgação)
(Divulgação)

Mas o SUV não para por aí: o EX90 é o primeiro modelo de produção em série no mundo a trazer um LiDAR (sigla em inglês para “sistema de detecção e telemetria da luz”), que usa feixes de laser para medir as distâncias e criar mapas 3D altamente precisos. Ele se soma aos diversos radares, sensores e câmeras para aprimorar os vários ADAS e recursos de segurança (o EX90 “enxerga” pedestres e animais a até 820 metros, por exemplo).

O inovador equipamento é instalado de modo nada discreto do lado de fora, acima do retrovisor interno, mas não quebra a harmonia do design escandinavo típico da Volvo. O EX90 lembra muito o XC90 e tem a mesma distância entre-eixos de enormes 2,98 metros, apesar de ser 8 cm mais longo (são 5,03 metros).

Extremamente espaçoso e com um grande teto panorâmico (que deveria ter uma cobertura retrátil para encarar nosso clima tropical), ele leva sete pessoas com extremo conforto, incluindo bancos maravilhosos e ar-condicionado de quatro zonas, e a versatilidade é garantida pelo rebatimento individual dos assentos – sempre elétrico, para facilitar a vida.

Mesmo com tantos ocupantes, ainda sobra um porta-malas de cerca de 350 litros, além do “frunk” (bagageiro dianteiro) de 50 litros. Já com só cinco pessoas, o porta-malas ultrapassa os 600 litros.

Dentro do EX90, é desnecessário dizer que há muitos mimos – da massagem no banco com ajuste lombar em quatro direções, ventilação e aquecimento ao sistema de som premium Bowers Wilkins com Dolby Atmos 3D e mais alto-falantes do que no XC90 (são 25, sendo dois no apoio de cabeça do motorista).

O design é igualmente clean, inspirado na natureza, incluindo a madeira certificada tradicionalmente usada em pisos de casas escandinavas. Ele tem sido assim há tempos – a Volvo foi a primeira a “copiar” o estilo Tesla, e há tempos muitos reclamam dessa tendência.

Não faltam informações diante dos olhos como no inexplicável EX30, pois aqui, além da exagerada tela central, ao menos há um quadro de instrumentos diante do motorista, pequeno mas com informações críticas, completado pelo head-up display (projeção de informações no para-brisa).

O que falta faz falta no EX90 são botões, em um sacrifício pelo design “mínimo”/“smart and connected”, a ponto de ter só dois controles para as quatro janelas, exigir usar a tela para ajustar até os retrovisores e, no console central, trazer só um mísero botão para controle de áudio.

Resultado: você precisa mexer na tela para quase tudo (incluindo abrir o porta-luvas) e ainda leva bronca se o faz com o carro em movimento, mesmo que tenha acionado o extremamente competente sistema de direção autônoma nível 2, para caso de distrações – que não deveriam acontecer justo ao usar funções de um carro da marca que preza justamente pelo máximo nível de segurança). Ao menos há alguns setores fixos na tela para certas funções. Ainda assim, pedimos: mais botões, por favor!

Para partir, após ser recebido com um show de luzes, basta:
● entrar no carro,
● colocar o celular (ou o cartão NFC) no console,
● pisar no freio,
● e escolher D na alavanca de câmbio posicionada na coluna – mas, ao sair do carro, é preciso tocar um sensor na porta pra travá-lo.

NA ESTRADA

Na minha avaliação, coloquei o destino no GPS conectado do sistema Google Automotive, que dispensa o uso do celular (basta logar sua conta do Google no carro). Saí de Newport Beach para uma vinícola no interior, e, no trecho urbano, o XC90 agradou com o modo “auto” da recuperação de energia: diferentemente do “one pedal”, só freia se há carro adiante, e de modo bastante suave e progressivo, como faria um bom motorista.

Na cidade, e depois na estrada, o EX90 impressionou pela agilidade surpreendente, apesar as 2,5 toneladas: mérito dos motores elétricos, um por eixo, que somam nada menos que 517 cv e 910 Nm, dados dignos de um superesportivo, garantindo 0-100 km/h em 4,9 segundos. Mas o EX90 não é esportivo, e isso ficou claro quando, ao combinar sua enorme disposição com as curvas de uma serra, vimos que, apesar de ser estável e seguro, a personalidade é de um carro de família – como deveria mesmo ser, com direção, freios e suspensões (com molas a ar e altura ajustável) priorizando o conforto.

E o EX90 cumpre esse papel muito bem. Se as versões a combustão e híbrida sempre impressionaram pelo bom nível de silêncio a bordo, o EX90 leva isso a extremos: mesmo sob calor de 40oC, com o ar-condicionado “no talo” e a refrigeração da bateria de 111 kW – que, pelo teste, renderia de 300 a 550 quilômetros de autonomia – não se ouve quase nada a bordo, nem mesmo o rolar dos enormes pneus aro 22. Mas o bom asfalto da Califórnia ajudou, então resta ver como se sai no Brasil – onde estreia em poucos meses, ainda sem valor definido (deve ficar na faixa de R$ 1 milhão). Para quem pode pagar, é uma ótima aquisição.