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(Carros pra Casar? Costuma-se falar daqueles que sofrem grande desvalorização e ficam com um valor de revenda tão baixo que você se recusa a vender. Ou daquela versão manual de um sedã médio pelo qual ninguém mais tem interesse. Enfim, daqueles carros dos quais você quer se livrar e não consegue. Mas essa não é a minha visão de um casamento; não o vejo como algo do qual as pessoas querem se livrar. Para mim, casar é uma forma de ficar pra sempre com alguém (ou algo, no caso aqui) que se ama. Nessa nova seção do Blog Sobre Rodas, portanto, falarei dos carros que conquistaram meu coração. Daqueles pra colecionar, pra casar, pra ter para sempre em sua companhia.)

O Civic Si Coupé estreia o Carros pra Casar. Ele está saindo de linha agora, com a chegada da nova geração da família Civic ao Brasil, então se você quer um zero-quilômetro corra para uma concessionária para pagar R$ 132.100 (mas talvez se decepcione, pois muitas já não o tem). Claro que a décima geração também deve ganhar, em breve, uma versão Si – e ela também deve vir ao Brasil. Mas muito provavelmente terá motor turbo, o que mudará bem, de cara, a mais sedutora de suas qualidades. Vamos lá.

O que desperta a paixão

  • O motor 2.4 16V é a grande arma de sedução desse Civic Si Coupé de nona geração. É um desses aspirados que estão em extinção, que nos fazem lamentar a chegada da era do downsizing, do domínio de motores turbo. Com duplo comando e 16V, tem o incrível sistema de variação de tempo e abertura de válvulas i-VTEC – Variable Valve Timing and Eletronic lift Control (controle eletrônico da variação do tempo e abertura das válvulas). Na prática, significa que o comando de válvulas acaba tendo dois perfis bem diferentes, um pra baixas rotações e outro para altas.
    A linha vermelha do conta-giros aparece só depois das 7.000 rpm – ponto onde o motor entrega a potência máxima, de 206 cv.  Mas o que mais importa até mais é o que acontece antes. Na primeira e segunda marchas não dá pra perceber tão bem, de tão rápido que o motor sobe de giro e o carro ganha velocidade (0-100 km/h em 7s2). Mas da terceira e diante dá para notar bem a “mágica”. O giro do motor sobe progressivamente, e, bem quando vai chegando a 4.000 rpm e aparenta por um átimo que o fôlego está acabando, a primeira luz da atuação do sistema i-VTEC se acende no canto esquerdo do painel. É um pedido, uma súplica para que você não troque de marcha nem alivie o pé do acelerador. Como se dissesse “a festa está apenas começando.”  Com um pouco de exagero, é como se acionasse um segundo motor – e mais bravo que o primeiro.
    A essa primeira luz se seguirão outras cinco, que vão se acendendo conforme se ganha velocidade – o que acontece muito rápido. A elasticidade do motor é incrível, invejável. Duas últimas luzes se acendem, vermelhas, indicando que enfim é a hora certa de trocar de marcha. A disposição do motor é tamanha que normalmente a pista acaba antes. A alavanca de câmbio curta de engates justos e incrivelmente precisos completa o excelente powertrain. E um indicador na tela central que mostra a cada instante o quanto você está usando da potência do motor completa o pacote de diversão.
  • O visual também ajuda muito. O design é ousado, anguloso, diferente. Muito distinto do sedã, que já não é exatamente o mais careta do segmento. Há também um aerofólio generoso, belas saídas de escape cromadas e rodas exclusivas. No interior, bancos esportivos, firmes e vermelhos. Pedaleiras cromadas, painel de instrumentos com fundo vermelho, conta-giros generoso. Certo exagero, talvez, porém adequados à proposta e dirigibilidade.

O que pode levar ao divórcio

  • O ronco tímido. Um motor que gira alto assim precisa ter um som rasgado, visceral. E não é o caso aqui. O 2.4 trabalha silencioso em baixa rotação e com aspereza quando sobe de giro.
  • Os freios preguiçosos. Um carro assim, que sempre pede velocidade, precisa saber também como parar rápido. Nesse Si parece que os engenheiros não pensaram nisso, e acabaram não dimensionando bem os freios à performance. São lentos, são fracos e pouco eficientes. Uma decepção que já vem da geração anterior, a primeira que conheci (voltaremos a ela).
  • Os estranhos central multimídia e computador de bordo. Comandos são difíceis e pouco intuitivos, resolução de tela baixa, escolha de cores cansativa, baixa qualidade sonora. Uma tragédia. Botões no volante compensam em parte a ausência de botões no painel.
  • Uma paixão antiga. Talvez o maior risco ao relacionamento com esse Civic Si seja o Civic Si anterior. A carroceria oferecida no Brasil entre 2007 e 2012 era apenas a de sedã, que pouquíssimo se diferenciava das demais versões. Tinha aerofólio, inscrições i-VTEC e etc., mas não chamava tanta atenção quanto o Coupé. Por outro lado, seu 2.0 girava ainda mais alto – com pico de 192 cv a 7.800 rpm! –  e o ronco era um pouco mais invocado e agudo. A direção era bem mais direta, afiadíssima, e as suspensões, consideravelmente mais duras, o deixavam ainda mais “no trilho” nas curvas (sacrificando ainda mais o conforto cotidiano, porém). Como esportivo, era ainda mais visceral, mais brutal, mais malcriado – no bom sentido, é claro. Então não precisa se preocupar. Mesmo que você não encontre um Si Coupé zerado por aí, não tem problema. Talvez você até acabe ainda mais feliz como segundo dono de um desses Civic Si Sedan. Confira as fotos na galeria no alto dessa página.

Filhos?

  • Depende. No modelo Coupé de 2014-2016 não rola. O péssimo acesso ao banco traseiro é o maior obstáculo. E aí está outra vantagem do Si Sedan mais antigo. Tinha quatro portas e ótimo espaço, iguaizinhos ao do Civic “civil”, “de tiozão” (assim como o decepcionante porta-malas de hatch médio). De qualquer modo, como esportivo de pai de família como eu (não pode?), que precisa ficar colocando e tirando crianças do banco de trás, o Si Sedan 2007-2012 era ainda mais acolhedor.