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Diz o dito popular, quando uma pessoa está muito à frente de outra: “Enquanto você está indo com a farinha, eu estou voltando com o bolo.” (ou “Enquanto você está indo com o milho, eu estou voltando com o fubá”). No setor automotivo, poderia dizer que enquanto a Volks está indo com a farinha, a Toyota está voltando com o bolo.

Pois enquanto a Volkswagen anunciava este mês no Salão de Frankfurt, na Alemanha, um aparentemente audacioso plano de eletrificação, no estande da Toyota um Prius solitário comemorava discretamente 20 anos de vida. Sim, enquanto o modelo híbrido da Toyota já é maior de idade, os da Volks apenas engatinham.

Já na quarta geração, o Prius é o primeiro híbrido de grande volume de vendas do mundo, vendido desde 1997 no Japão, desde 2000 nos EUA e desde 2013 no Brasil  (leia aqui a avaliação da geração atual do Prius e um aqui um comparativo com o Ford Fusion Hybrid).

Mas, voltando ao plano de eletrificação do Grupo Volkswagen – chamado de Roadmap E: ele foi anunciado em Frankfurt com pompa e circunstância (leia aqui). Uma medida necessária, principalmente após o escândalo do dieselgate (sistema para fraudar os testes de emissões de poluentes em motores a diesel). Recuperar a imagem da empresa nesse momento é essencial, e essa recuperação será ajudada pela eletrificação, caminho do qual nenhuma marca escapa – mas que algumas desbravaram antes.

Um olhar mais atento mostra que esse plano de eletrificação da VW não é assim tão ambicioso. Dividindo os 80 modelos (50 elétricos e 30 híbridos) prometidos até 2025 sobre as duas novas plataformas pelas 12 marcas que formam o Grupo, e ainda mais considerando que cada uma delas tem vários modelos, é pouco – médias de 2,5 híbridos e 4,2 elétricos por marca). Enquanto isso, a Toyota tem hoje mais de 21 carros de passeio híbridos, sendo 12 Toyota (Yaris, Auris, RAV4, Prius, Prius C, Prius+ ou V, Prius Plug-in, Auris Touring, C-HR, Camry, Avalon, Highlander) e nove Lexus (CT, IS, NX, ES, RX, GS, LS, RC e LC). Somando os comerciais leves, são 37 híbridos no mundo, sendo 28 Toyota e nove Lexus. E essa oferta ampla se reflete nas vendas, obviamente.

Dos mais de dois milhões de híbridos vendidos no mundo em 2016, cerca de 1,7 milhão foram para o mercado japonês, enquanto os EUA ficaram com cerca de 400.000. São os maiores mercados. E não por acaso, são, hoje e há tempos, dominados pela Toyota. O que nos leva ao número mais impressionante: a marca vendeu em 2016 1,4 milhão de híbridos – quase dois terços do total mundial e 16% mais que em 2016, em um crescimento consistente. A Honda, segunda colocada, vendeu cerca de 218.000 híbridos no mundo no mesmo período.

Para dar uma ideia, nos Estados Unidos a família Toyota Prius representou nos últimos anos quase metade das vendas de híbridos e elétricos – e com a ajuda dele Lexus e Toyota conquistaram cerca de 60% do mercado de híbridos no país. Já no Japão, o Prius é o mais vendido considerando todos os modelos, híbridos ou não (o SUV C-HR ja é terceiro, em um resultado impressionante – e deve vir ao Brasil; leia aqui). Já na Europa Ocidental, os híbridos já representam metade das vendas da Toyota. São híbridos 41% dos Yaris, 78% dos C-HR e 99% dos Lexus. As vendas desses carros pela marca cresceram 50% no quadrimestre, indo a 106.000 unidades.

E enquanto a Toyota dominava o mercado dos híbridos, a Volkswagen ficou parada (como outras marcas). No melhor ano nos EUA, vendeu menos de 6.000 Jetta Hybrid, só 4% do total do modelo – e hoje, representando menos de 0,5% das vendas totais do Jetta, a versão Hybrid acaba de sair de linha, deixando solitário o Touareg Hybrid, que vende menos ainda. Mesmo na Europa, a Volks é fraca nessa tecnologia.

Um dos erros da Volks foi apostar demais no diesel, uma tecnologia em extinção (e que acabou resultando no dieselgate justamente por estar ficando obsoleta em emissões). E a queda dos preços do petróleo nos últimos anos nos EUA só enfraqueceu o desenvolvimento, porque o americano, quando cai o preço do petróleo, só quer saber de motorzão. E assim a Volks ficou para trás.

Com mais estímulos agora, ao menos nos mercados europeus, e com o surgimento de competidores forasteiros como a Tesla, a tendência é que de fato a Volkswagen consiga correr atrás do prejuízo, principalmente no que se refere aos elétricos, já que, chegando atrasada na corrida, parece querer pular etapas, indo mais diretamente ao elétrico –  e fazendo híbridos só porque são inevitáveis.

Quando falamos em carros elétricos, entretanto, a Toyota fica atrás de outras marcas. É seu ponto fraco, pois não tem um modelo puramente elétrico representativo – mas fez uma aposta diferente e tem um dos únicos a hidrogênio produzidos em série no mundo, o Mirai (que não deixa de ser elétrico, e pode até ser sua evolução, pois muda a fonte da energia; leia mais aqui). Nesse mercado, além da Tesla, marcas como BMW-i e Nissan, entre outras, estão à frente. Mesmo a Volks tem o e-Golf — uma adaptação do modelo na mesma plataforma MQB, e não um carro nascido em uma base “eletrificada” –, que tem vendido razoavelmente bem para um elétrico puro (mas ainda muito pouco pensando no mercado todo). Segundo dados dos EUA, em 2016, a Tesla emplacou 41.651 elétricos, seguida da Nissan (basicamente só Leaf, 14.006 unidades), da BMW 7.625 emplacamentos) e da Fiat (5.095). As vendas totais de elétricos subiram para 79.915 unidades, ante 72.374 em 2015.

Mas claro que a Toyota não vai ficar para trás. Além de já desenvolver novas tecnologias, como a do Mirai, anunciou recentemente investimentos em novos carros elétricos e híbridos. E não foi só ela: a Mercedes-Benz também criou a submarca de elétricos EQ – e hoje, como a Volks, tampouco tem modelos híbridos e elétricos vendidos em volume representativo. Todas terão que seguir por esse caminho, até porque diversos países estão criando leis para acabar de vez com motores a combustão, como aconteceu na Inglaterra (leia aqui). Será uma corrida cheia de inovações.