07/12/2017 - 8:03
Era para ser o Gol. Pena que não foi. Porque se o novo VW Polo é ótimo enquanto Polo, como Gol seria melhor ainda. Porque você pode ainda gostar do Gol – embora datado ainda é sim um hatch bom e acessível –, mas ele de fato tem que evoluir da última geração, nascida ainda em 2009 e remodelada pela última vez em 2016. (Confira aqui a avaliação com o Polo 200 TSI Highline e aqui com o Polo 1.6)
Como revelamos com exclusividade há quase um ano, esse velho Gol seria substituído por um novo, que nada mais seria que uma versão brasileira – praticamente idêntica – do novíssimo Polo europeu. Assim, nosso Gol não seria mais o “primo pobre” do Polo europeu, até convivendo em faixas de preço distintas, mas sim o próprio, lançado quase simultaneamente ao Polo e chamado aqui de Gol para honrar seus 23 anos de liderança. Seria o melhor Gol de todos os tempos.
E depois de uma semana ao volante de uma versão Comfortline 200 TSI, posso dizer que seria mesmo o melhor Gol de todos os tempos. Mas, de novo, não é um Gol. Porque o hatch ficou tão bom que acabou também caro demais para um Gol, e virou Polo de novo. E assim o novo Gol ficou para 2020 (como também adiantamos em fevereiro (leia aqui) e agora a Volks confirmou em evento na Argentina (leia aqui).
Os hatches compactos, como outras categorias, vem crescendo com o tempo. Enquanto o Chevrolet Corsa tinha 3,73 m de comprimento nos anos 1990, 3,83 m nos anos 2000, seu sucessor e atual líder de vendas, o Onix, mede 3,93. O Palio tinha 3,73 nos anos 1990, o Fiat Argo hoje tem 3,99 m… Outros modelos da categoria – o vice-líder Hyundai HB20, os franceses Citroen C3 e Peugeot 208 – todos beiram quatro metros. Seria natural, portanto, que o novo Gol, que já tem 3,90 m, chegasse mais perto dessa medida. (Confira aqui um comparativo do VW Polo com os principais concorrentes)
O Polo até passa um pouco disso – são 4,057 m – e isso talvez tenha ajudado a decidir por posicioná-lo como Polo mesmo. Mas, se permitem começar já com uma crítica, espaço interno e porta-malas podiam ser maiores em um carro que é exatos 6 cm maior que o Honda Fit (antes de crescerem seus para-choques: o Honda leva 20% mais bagagem e tem mais espaço atrás, principalmente para os joelhos e o quinto passageiro; já o Polo se assemelha mais em espaço ao Fiat Argo, que mede o mesmo que o Fit – e ambos têm porta-malas apenas 10 litros maior que o de um Renault Kwid).
Já que comecei com as críticas, vamos já aos tais defeitos que no Gol não incomodariam, mas nesse Polo de quase R$ 70.000 são mais difíceis de aceitar. O design, dentro do mais conservador conservadorismo da Volks, não empolga o consumidor brasileiro, mais apegado a linhas rebuscadas dos Hyundai e cia. Assim, se o fato de parecer um “mini-Golf” já foi uma poderosa isca, não é mais. E, pela evolução natural das linhas do nosso Gol dentro do conceito de family-face (cara da família) enquanto o Polo ficou fora do nosso mercado, agora ele é visto por muitos como um “Golzão”. Não tem o mesmo ar de novidade e não chama a atenção nas ruas como um Fiat Argo, por exemplo. Mas certamente agradaria muito mais como uma evolução do Gol.
Esse conservadorismo todo não está só fora da cabine, e talvez incomode até mais dentro dela. No lugar da tela multimídia “flutuante” do Argo, dos materiais com muitas texturas e uma série de formas bem trabalhadas, tudo no Polo parece mais reto, liso e sem graça, simples demais. A versão avaliada nem tinha o painel digital, opcional exclusivo do Highline, então não há nada ali que chame muita atenção, que empolgue. Deviam chamar alguém da Fiat pra dar um toque de emoção. E o ar-condicionado digital devia vir de série, não como opcional.
Ainda “batendo” no Polo, falta um capricho no acabamento. Não tenho crítica nenhuma à construção e aos encaixes, por sinal muito bem feitos, e embora essa versão tenha luzes de leitura para quatro ocupantes com direito a porta-óculos na frente e outros toques “finos”, alguns detalhes destoam do excelente carro que é. Logo ao abrir a porta – com a chave no bolso graças à chave presencial –, por exemplo, os olhos batem no trilho exposto do banco do motorista.
Ao sentar, tecido e espuma do banco são simples demais para um carro desse valor, e as portas tem um tecidinho em meio a um monte de plástico rígido, como no painel. E um lembrete à Volks: plásticos lisos, mesmo que de qualidade superior, costumam passar uma impressão pior do que os texturizados.
A alavanca de freio de mão também merecia um revestimento mais caprichado, uma cobertura de couro:
Mas basta dar a partida – de novo sem precisar usar a chave – e botar o Polo em movimento para logo ser conquistado por ele. O que se economizou no interior nao se poupou em segurança (tem quatro airbags, freios multi-colisão, ESP, nota máxima no Latin NCap, etc) e, principalmente, na construção e na mecânica.
O conjunto motriz, ao menos nessa versão Comfortline 200 TSI (a única que tive a chance de avaliar por enquanto) é quase perfeita. O motor 3 cilindros 1.0 com turbo e injeção direta responde com muito vigor após um discreto lag da turbina – e outro do câmbio, dependendo da marcha selecionada, já que a caixa automática tradicional de seis marchas costuma priorizar o consumo e trocar as marcha cedo para aproveitar o ótimo torque do motor turbinado (o 200 do nome: 200 NM ou 20,4 kgfm, o mesmo que têm os tradicionais motores 2.0 aspirados, e que importam mais que os 128 cv máximos).
Na cidade, essa mecânica me fez marcar com facilidade 10 a 12 km/l com gasolina, sempre sem esticar marchas, silenciosa e confortavelmente. O único porém está nas saídas de primeira marcha, que estavam um tanto bruscas, ao menos na unidade avaliada, causando alguns trancos indesejados e dificultando manobras justas.
Na estrada, marquei mais de 20 km/l quando o limite era 90 km/h e cravei 18 km/l a 120 km/h, com o conta-giros estacionado a 2.400 rpm em setxa marcha e quase nenhum ruído na cabine (em algumas retomadas, porém, ele insistia em puxar a terceira marcha sem necessidade, trazendo o ruído metálico do 3 cilindros para a cabine; eu logo usava as aletas no volante para voltar à quarta marcha, de onde não devia ter saído).
As qualidades da plataforma MQB aparecem nas curvas, quando, apesar da maciez incomum (para um Volks) nas suspensões – ótimas para nossas cidades –, o comportamento do Polo é extremamente bom. Em caso de exagero, o diferencial eletrônico XDS atua com eficácia antes mesmo do controle de estabilidade precisar atuar. A carroceria segue inabalada, com controle total do motorista pela bem calibrada direção elétrica.
Enfim, o Polo me decepcionou no visual interno e externo pelo conservadorismo. Me deixou surpreso com o espaço interno apenas razoável. Me frustrou os seus bancos e acabamento. Em tudo isso, seria excelente como sucessor do Gol, mas fica devendo diante do que entregam os melhores rivais mais recentes, principalmente nessa faixa mais alta de preços, já próxima de R$ 70.000.
Onde o VW Polo me conquistou, porém, foi ao volante. Tudo é “redondo” e bem acertado. É um carro que, além de gostoso de guiar, tem um casamento de segurança, desempenho, economia, conforto e dinâmica que não encontra rival à altura em nosso mercado, mesmo nessa faixa de preços (já não tão baixa assim). E ainda tem uma excelente central multimídia, fácil de usar, completa e com integração perfeita com Android Auto e Apple CarPlay. Merecia só um toque extra de cuidado, um pouquinho mais de emoção. Parece que os italianos entendem melhor disso…