30/07/2019 - 8:00
Hatch médio é mesmo uma espécie em extinção? Há quem ache que sim, há quem diga que não. A vendas deles estão em queda e a Ford aposentou o Focus no Brasil, isso é fato, mas a Mercedes-Benz acaba de lançar esse novo Classe A, a BMW estreou o novo Série 1 e Audi e Volks farão novas gerações – já quase prontas – de A3 e Golf, respectivamente. Nós, da MOTOR SHOW, acreditamos que seguirão firmes como carro de nicho – e se fortalecerão quando a loucura do mercado por SUVs diminuir.
Esses modelos não devem morrer definitivamente porque ainda há quem prefira o prazer ao volante que proporcionam à posição de dirigir alta ou à robustez extra dos SUVs. Por isso, faz todo sentido investir mais em hatches médios nas versões mais potentes e/ou esportivas, que reforçam essa qualidade – como as duas aqui.
No caso do Golf, essa versão esportiva GTI é a única que foi mantida em produção no Brasil nessa geração – as demais deram lugar nas linhas, de montagem e de produtos, ao SUV compacto T-Cross, baseado no Polo (para atender ao mercado). No caso do Classe A, a Mercedes-Benz trouxe essa nova geração inicialmente em versão única, 250 Vision, abrindo mão das opções de entrada com o brilhante 1.3 turbo de 163 cv (que avaliamos há um ano na Europa).
O GTI tem uma cara muito mais esportiva, até mesmo porque o A 250 não é oficialmente um esportivo: a categoria é reservada aos Mercedes-AMG A 35 (306 cv) e A 45 AMG (deve beirar 400 cv), que estão para chegar. Mas as duas marcas alemãs trabalham com “escalas” de potência diferentes, então esse Mercedes-Benz A 250, sem AMG, já é páreo duro para o mais elogiado Volkswagen.
Vendido por R$ 201.900, o Mercedes-Benz A 250 é mais caro. O Golf parte de R$ 151.530, mas como todos seus opcionais são itens de série no Classe A, para equipará-lo ao rival é preciso somá-los, chegando ao preço de R$ 174.350. Ainda assim, o A 250 tem coisas que o rival não tem – como o freio de mão elétrico e os dois assentos dianteiros elétricos com massagem –, mas fica, inexplicavelmente, devendo a ele itens relativamente “básicos” como chave presencial que abra as portas e retrovisor eletrocrômico, além do ACC (piloto automático adaptativo). No fim, o conteúdo é bastante equilibrado (veja tabela abaixo).
Uma vantagem do Classe A, logo de cara, aparece na idade: enquanto ele acaba de estrear sua quarta geração, o Golf chega ao fim da sétima – e muda, por aqui, daqui a cerca de um ano. Isso justifica parte da diferença de preço entre eles, de R$ 27.550. Mas será que ao volante o Mercedes-Benz nessa versão (aparentemente) “civil e comportada” tem chance diante do furioso Golf GTI, um clássico esportivo? Quem apostar que o Classe A é só status e luxo e o Golf leva fácil no desempenho pode acabar perdendo. Porque às vezes as aparências enganam.
Esportivo VS. Sleeper
O Golf GTI, ainda que de forma elegante e sem exageros, tem logotipos, saias e escape que deixam bastante claro que se trata de um esportivo. Outros carros, como esse A 250, têm aparência “comum” e comportada, mas um desempenho que surpreende. São chamados sleepers (dorminhocos). Mais ou menos o oposto dos “esportivados” que tanto sucesso fazem aqui no Brasil (carros com visual invocado, mas sem mecânica que corresponda).
Olhando as motorizações, já dá para ver que o Mercedes não dá moleza para o Golf. Ambos têm motor quatro cilindros 2.0 turbo com injeção direta e torque de 35,7 kgfm, mas há discreta vantagem na potência para o GTI – são 230 cv, contra 224 do rival. E ambos usam transmissões automatizadas de dupla embreagem, com seis marchas no Golf e sete no Classe A. Talvez a marcha extra explique porque o sleeper da Mercedes é mais rápido no 0-100 km/h (6,2 segundos, contra 7 do rival). Não é pouca diferença no caso de esportivos – ainda mais se o esportivo “declarado” é o perdedor.
Mas aceleração de 0-100 km/h não é tudo, e o GTI é mais instigante ao volante. A começar pelos bancos que “abraçam” melhor o corpo (elétrico, só o do motorista). Além disso, suas suspensões – com multi-link atrás como no rival – são bem mais firmes, e sua direção, mais pesada. Tem dinâmica de esportivo puro e duro, equilibrado como poucos, extremamente provocante. Pura adrenalina, o tipo de carro que sempre “pede”para você acelerar mais. Mas, acima de tudo, o que cativa no GTI é o ronco – que, com a opção personalizável dos modos de direção, pode ser colocado no Sport mesmo com o motor no Eco (nessa combinação, ainda que com motor em baixas rotações para poupar gasolina, seu ronco grave segue presente na cabine; já no modo Eco, o Golf é absolutamente silencioso).
O melhor mesmo é botar tudo no Sport, para esticar mais as marchas e dar “estouros” nas subidas e reduzidas (instantâneas). Quem quiser mais controle pode assumir as trocas pelas tímidas aletas no volante ou pela alavanca, bem posicionada e de boa pegada. Pena que o lag do turbo às vezes atrapalhe a tocada, mas de modo geral o motor sempre tem força de sobra. Surpreendente é que, andando na boa, no modo Eco – com sistema que faz “banguela” automática quando se alivia o pé direito –, o GTI é econômico. Durante a avaliação, fez ótimas médias de 9 km/l na cidade e 15,5 na estrada (2.200 rpm a 120 km/h em sexta).
Mas se for para andar devagar e poupando gasolina, o A 250 faz ainda melhor – e com muito mais luxo e conforto. Também tem roda livre, que no modo Eco desacopla o motor do câmbio para economizar, e fez 10 km/l na cidade e 17 na estrada (com a marcha extra, a 120 km/h marca só 1.800 rpm). Nessas condições, tem respostas mais suaves e é mais silencioso, além de mais confortável, com suspensões sensivelmente mais macias.
E isso não significa que o A 250 não saiba andar forte. Anda até mais. Nem é preciso mudar para o Sport para ele ficar aceso (o Comfort já basta). Mas a carga extra na direção – leve e agradável na cidade – é muito bem vinda. Com relação variável, o sistema é mais direto e preciso. Para completar, não há nenhum lag do turbo, e tudo é entregue de forma tão linear que você chega a 170/180 km/h sem ninguém a bordo nem perceber.
E as suspensões não decepcionam em uma tocada rápida: apesar da maciez, não deixam o hatch deitar demais nas curvas. Às vezes ele até parece “avisar” que vai sair de frente… mas não sai (a vetorização de torque, que o rival também tem, atua discretamente em caso de exageros). Então, se há alguma decepção ao volante desse A 250, é com seu ronco – ou melhor, com a ausência dele. O A 250 é tão silencioso que às vezes parece até um carro elétrico. Mesmo no Sport, mesmo quando você quer ouvir o motor… mal escuta.
Um detalhe interessante para o uso urbano: os dois têm sistema park assist (assistente de estacionamento semiautônomo), mas o do Classe A é mais sofisticado: além de, como o do Golf, medir a vaga e esterçar o volante, também assume trocas de marchas, acelerações e frenagens, avisando ao motorista ao concluir a manobra.
Beleza interior
Se visual e dirigibilidade/desempenho não solucionarem sua dúvida, a cabine aqui pode ser fator decisivo – ou até fazer mudar de ideia, caso estivesse pendendo para o GTI. Sabemos que o Golf não é qualquer carro e o GTI não é qualquer versão do Golf. Além da fartura de equipamentos, tem revestimento com materiais macios, carpete nos porta-objetos, painel digital, ergonomia elogiável… Mas o interior do Classe A é tão incrível que o ofusca. Sozinho, já quase justifica a diferença de R$ 28 mil. É revolucionário, com quadro de instrumentos “retrô-futurista” ligado com a central multimídia em tela única, extra-fina e retangular. Inigualável, pura elegância.
Funcionalmente, o Golf ainda tem alguns comandos mais diretos e claros (sempre uma qualidade dos Volks). Mas esse Classe A, mesmo com touchpads no volante que às vezes demoram a responder ou travam (cada um controla uma tela), consegue inovar, provocar, encher os olhos com formas inovadoras e acabamento mais fino, com carbono e couro. Seu teto solar também é maior, e tem cortina elétrica (no GTI é manual).
Apesar da vantagem no comprimento e no entre-eixos (veja fichas) o espaço interno é similar nos dois, que atrás têm espaço limitado e túnel alto, mas agradam os ocupantes com saídas de ar-condicionado e luzes de leitura individuais. Já no porta-malas, vantagem do Mercedes: acomoda 370 litros, contra 338 do Golf.
O preço de ser premium
Embora não seja a maior preocupação de quem compra um carro desses, as diferenças nos custos de pós-venda são enormes… então é preciso pagar um preço alto para “ser premium”. Enquanto a Volks fabrica o Golf no Brasil e oferece três anos de garantia e as três primeiras revisões grátis, a Mercedes-Benz importa o Classe A da Alemanha, tem garantia de só dois anos, cobra caríssimo nas revisões e ainda tem um pacote de peças mais caro (o dobro; veja valores tabelas). Nesse ponto, portanto, uma grande vantagem para o Volks.
Escolha sua dose
Se o que você quer é um esportivo de verdade, com todos os seus ônus e bônus, leve o Golf. Seu visual é intimidador e a dinâmica é superior para quem busca esportividade. O prazer de dirigir um GTI é praticamente insuperável, e ele seria praticamente imbatível nessa categoria e faixa de preços, não existissem carros como o A 250 Vision.
Porque se o que você procura é um hatch de luxo com a mais incrível cabine da atualidade, construção e suspensões impecáveis e mais conforto a bordo, o Mercedes vale cada centavo a mais – e, apesar do visual discreto, é capaz de deixar o GTI comendo poeira (ganhando nossa hipotética aposta).
Então você escolhe sua dose de adrenalina, luxo e tecnologia: é mais importante a experiência na cabine ou ao volante? Vale sacrificar conforto por esportividade… o tempo todo? Parecer esportivo importa, ou melhor mesmo é ser rápido e ágil com discrição? São dúvidas bem interessantes, considerando carros como esses. Boa escolha!