Tente imaginar a largada de uma corrida em que estivessem alinhados no grid, lado a lado, Sebastian Vettel ao volante de seu carro de Fórmula 1 e Jorge Lorenzo, campeão da MotoGP em 2012, a bordo de sua motocicleta. Quem seria mais rápido? Quem chegaria primeiro após uma volta completa? É uma daquelas disputas impossíveis cuja dúvida sobre o resultado atormenta os apaixonados pelos esportes sobre rodas. Impossível porque, nesse nível, existem apenas dois circuitos comuns para essas duas categorias. Na verdade, a rigor, há apenas um: no de Sepang, na Malásia. Isso porque o circuito de Barcelona, onde a Fórmula 1 realiza o GP da Espanha e as motos disputam o da Catalunha, o monoposto é penalizado por uma chicane a mais – o que não os deixaria em condições iguais.

De qualquer forma, a brincadeira é divertida e conseguimos realizá-la com a ajuda de muitos números e também de alguns especialistas no assunto. Se nos limitássemos a considerar apenas a velocidade máxima, o Fórmula 1 estaria perdido. No circuito de Sepang, um F-1 chega a passar apenas um pouco dos 300 km/h. Já Lorenzo, com sua Yamaha, supera os 320 km/h na mesma pista. Os dados não surpreendem quem conhece um pouco de aerodinâmica, já que a enorme resistência – por conta principalmente dos pneus e das asas – é uma característica do monoposto.

A revanche se dá no tempo de volta. Comparamos a pole position de 2012 e verificamos que Hamilton, com sua McLaren na pista da Malásia, parou o cronômetro no tempo de 1’36”219 com média de 207,5 km/h; Lorenzo, com a Yamaha, fechou o giro na mesma pista em 2’00”334 (com média de 166 km/h). Já em 2011, Pedrosa, com uma moto Honda de 800 cm3 (em vez de 1.000 cm3), obteve o melhor desempenho, com 2’01”462, levando 25 segundos a mais que Vettel (1’34”870). Mas a maior diferença entre os tempos obtidos em duas e quatro rodas é vista no circuito de Barcelona – apesar da chicane extra que o F-1 tem que percorrer em segunda marcha a apenas 95 km/h. No ano passado, Hamilton fez a pole no circuito espanhol com o tempo total de 1’21”707 (velocidade média de 205 km/h), quase 20 segundos a menos que o obtido por Stoner, o melhor na qualificação da MotoGP: 1’41”295 (o que dá uma velocidade média bastante inferior, de aproximadamente 168 km/h).

Nos últimos dez anos, a MotoGP tem se esforçado para melhorar o desempenho da categoria, e o tempo de volta caiu cerca de quatro segundos de lá para cá, principalmente com a troca das motocicletas com motores de 500 cm3 e dois tempos pelas de 1.000 cm3 e quatro tempos. A F-1, ao contrário, vem apresentando altos e baixos. Na Malásia, por exemplo, Schumacher obteve a pole em 2002 com tempo de 1’35”266; Alonso, em 2005, na época da Renault, conseguiu a melhor marca com 1’32”582, um resultado que ninguém nos anos seguintes conseguiu repetir. Isso acontece porque as autoridades esportivas, com o passar do tempo, têm feito de tudo para limitar a escalada de desempenho dos monopostos com normas restritivas.

No duelo virtual, portanto, não tem jeito: a moto é mais rápida nas retas e o F-1 no circuito misto. Mas porque o carro tem essa considerável vantagem? Para entender isso, pedimos ajuda a Claudio Lombardi, um engenheiro que conhece bem os dois lados da moeda. Lombardi foi chefe da equipe Ferrari de F-1 entre os anos de 1991 e 1995 e projetista dos motores da Aprilla de 2000 a 2010. “A primeira consideração que deve ser feita é sobre a carga. Para a moto, se trata apenas de massa, já que as questões aerodinâmicas são desprezíveis”, explica ele. “Um piloto de MotoGP viaja a 300 km/h “apoiando-se” quase totalmente na roda traseira – já que a dianteira, na reta, mal toca o asfalto. Portanto, quando inicia a frenagem, se encontra em uma situação de instabilidade, e, por isso, precisa agir muito antes que o piloto de F-1”, completa.

Eis o ponto. A chave de tudo é a freada. Claro que o downforce permite ao Fórmula 1 percorrer a curva em uma velocidade muito superior. Mas é sobretudo a fase de desaceleração que faz com que o carro ganhe uma boa margem sobre a moto. Por isso, concentramos nossas atenções sobre os dados disponibilizados pela Brembo sobre o sistema de freios de seis times de F-1 e de praticamente todos os times da Motovelocidade. Na Malásia, por exemplo, o F-1 freia pela primeira vez a 303 km/h. Esse número é uma média dos dez times aos quais tivemos acesso, e pode variar de acordo com a estratégia aerodinâmica de cada equipe. A moto freia a 327 km/h. Na entrada da curva, as velocidades são quase iguais (90 contra 86 km/h). Um piloto de F-1 freia, no entanto, somente por uma distância de 121 metros e por um tempo de 2,57”, contra 289 metros e 6,4” da moto.

“A moto se recupera depois, na reta; nas curvas ela é intrinsecamente mais instável, pela ausência do downforce. O piloto faz muita diferença porque pilotar a moto é um exercício de equilibrismo, de agilidade e de audácia. Por isso, os melhores são sempre os mesmos dois ou três pilotos”, afirma Lombardi. “Essa característica se mantém apesar da adoção dos dispositivos eletrônicos como o controle de tração porque cabe ao piloto pedir o acerto ao engenheiro, e esse acerto pode ser menos ou mais invasivo. Na Fórmula 1, pelo contrário, o nivelamento é maior. Por isso, podemos apontar sete ou oito pilotos com diferença de meio segundo”, explica o engenheiro. Uma peculiaridade que começa no desenvolvimento: o da F-1 se dá quase que praticamente em torno da aerodinâmica, e o motor é cada vez mais estrangulado. Já no projeto de um exemplar de motovelocidade, o motor acaba sendo a estrela principal.