17/02/2020 - 9:10
A Fiat Automóveis S.A. optou pelo mercado brasileiro em 1973, quando a Fiat SpA, a matriz italiana, decidiu implantar uma fábrica no Brasil. Em 1976, a montadora lançou seu primeiro carro por aqui: o simpático Fiat 147, modelo derivado do 127 italiano, mas com a estrutura mais reforçada para aguentar as temperaturas médias mais altas e as duras situações de uso impostas por nossas ruas e estradas.
Além disso, o carro deveria se adaptar ao uso da maioria dos países latino-americanos vizinhos do Brasil, potenciais clientes para compra do pequeno e econômico Fiat. E, é claro, que um exemplar desse modelo é parte do acervo que a Fiat está montando para contar esses quase 42 anos de história da marca no mercado brasileiro.
O acervo conta atualmente com 25 carros prontos e outro tanto em restauração. E na nossa visita à unidade industrial de Betim (MG), feita a bordo de uma Marea Weekend Turbo (leia mais aqui), tivemos a oportunidade de andar na pista de testes da fábrica com seis carros dessa coleção: Oggi CSS, Tipo 1.6 MPI., Fiorino Trekking, Tempra Ouro 16V, Uno 1.5 R e Uno Turbo. E foi uma experiência fantástica, dando uma dimensão exata de como a indústria automobilística evoluiu ao longo do tempo. Um verdadeiro túnel do tempo para quem trabalha na área jornalística há mais de 40 anos.
Oggi CSS
Para quem não sabe, o Fiat Oggi era a versão sedan do 147. O sedan destacava-se do hatch pela generosa capacidade do porta-malas, o que proporcionava outra característica positiva interessante para o Oggi: uma distribuição de peso mais uniforme entre os eixos dianteiro e traseiro, o que melhorava sua performance esportiva. Por isso, a Fiat escolheu esse modelo para representá-la no (na época) recém-criado Campeonato Brasileiro de Marcas.
Mas, para que ele pudesse competir no certame criado pela Confederação Brasileira de Automobilismo, era preciso que fosse criada uma versão de venda ao público semelhante àquela que competiria nas pistas. Assim nasceu o Oggi CSS (Comfort Super Sport), um sedan familiar tranquilo, apimentado com a esportividade dos carros de competição. O campeonato era tão importante para a Fiat na época, que a montadora chegou a contratar o bicampeão mundial de Fórmula 1, Emerson Fittipaldi, como um de seus pilotos para essa edição da competição, que ocorreu em 1984.
O Oggi CSS apimentado destacava-se do Oggi CS familiar pelo motor 1.4 (1.415 cm3) contra o tradicional 1.3 (1.297 cm3), além de possuir carburador com corpo duplo. Isso permitia o motor desenvolver 78 cv contra os 61 cv do propulsor 1300. Além disso, o Oggi CSS possuía relações de marchas mais curtas para torná-lo mais rápido nas acelerações. Dos adereços estéticos, destaca-se a asa traseira na tampa do porta-malas, rodas de liga leve, além de bancos esportivos, volante com desenho diferenciado e instrumentos de painel completos.
O CSS foi fabricado apenas na cor preta com detalhes em vermelho e tiveram, aproximadamente, 280 unidades produzidas para efeito de homologação do Oggi de competição.
Tipo 1.6 MPI
Lançado no final de 1993 já como modelo 1994, o Tipo 1.6 i.e., importado da Itália, surpreendeu o mercado nacional pelo preço extremamente interessante para a época: US$ 17 mil (cerca de R$ 53 mil nos dias de hoje). Um preço surpreendente, se considerarmos que o Tipo era o carro do porte de um Volkswagen Golf (que atualmente parte de pouco mais de R$ 77 mil) ou de um Ford Focus (que hoje custa aproximadamente R$ 75 mil). Apesar do conteúdo mais completo e tecnológico no Golf e Focus, o preço do Tipo ainda sim era uma pechincha!
O carro era vendido completo. Chegava ao consumidor com ar-condicionado, direção hidráulica, sistema de som, vidros dianteiros elétricos e outros mimos que deixavam o consumidor da época bem satisfeito. O resultado prático disso? A Fiat imaginava vender cerca de 800 unidades do seu importado por mês, mas, em poucos meses, já vendia 1.600 carros mensais. Uma surpresa positiva que apressou a ideia dos dirigentes da Fiat brasileira de acelerar o processo de nacionalização do carro, que a partir do final de 1995 (já como modelo 1996), passou a ser produzido na fábrica de Betim.
O Fiat Tipo 1995 do acervo é um desses exemplares nacionais e tinha pouco mais de 2.800 quilômetros rodados. Uma verdadeira raridade. Um carro que tratamos com todo o carinho que merece ser tratada uma joia rara. Com quatro portas, ainda hoje é um carro bem confortável, com fácil acesso de entrada e saída de seu interior, além de uma boa habitabilidade. Seu motor 1.6 de quatro cilindros desenvolvia 92 cv, suficientes para um desempenho satisfatório para um hatch familiar naqueles tempos. O Tipo, em curtíssimo espaço de tempo, conquistou o consumidor brasileiro e chegou, na época, a ser um dos carros mais vendidos de nosso mercado.
Fiorino Trekking
As picapes da Fiat são hoje um sucesso no mercado nacional. E a Strada só não é líder do mercado de picapes porque perdeu essa liderança no ano passado para a sua irmã maior, a Toro. Para quem pensa que a Fiat começou a fazer sucesso com picapes nos últimos anos, um grande engano: a Fiat já havia surpreendido o mercado em 1978, com o lançamento de uma versão picape do querido 147. Apelidada carinhosamente de “Tamanquinho”, pelo seu design que lembrava ao de um pequeno tamanco, a picapinha servia para pequenos empresários e sitiantes que necessitavam de um carro para trabalho que fosse, ao mesmo tempo, robusto e econômico. Do Tamanquinho, logo em 1980 chegou a versão furgão, batizada de 147 Fiorino em suas derivações Vetrato, Combinato e Settegiorni. Todas elas versões que combinavam o transporte de pessoas e carga de maneira bastante criativa. O lançamento do Uno, em 1984, trouxe consigo o lançamento da família de picapinhas derivadas até então desse último lançamento.
A primeira picape derivada do Uno chegou em 1988, chamada de Fiorino Pickup e sua versão fechada, batizada de Fiorino Furgão. Mas, em 1994, vieram as alterações técnicas e mecânicas que fizeram da família de trabalho Fiorino se transformar nas picapinhas que são sucesso até hoje em nosso mercado: foi aumentada a distância entre-eixos e, sucessivamente, o volume da caçamba e a suspensão traseira passou a ser feita através de eixo-rígido com feixes de molas longitudinais. Além de poder transportar mais carga, a nova suspensão reduziu sobremaneira o período e o custo de manutenção, fatores muito desejados para veículos de trabalho.
A Trekking que avaliamos na pista de testes da Fiat é de 1996. Era equipada com o motor 1.5 Fiasa de 76 cv, que se destacava pelo bom torque que surgia desde as baixas rotações. Essa versão se sobressaía na família das picapes pelas suspensões mais elevadas, o que permitia seu tráfego mais fácil por estradas esburacadas e sem pavimento. Além disso, essa picapinha possuía um acabamento mais refinado e era destinada a um público jovem, que poderia curtir aventuras nos finais de semana. As faixas laterais davam um ar descolado.
Tempra Ouro 16V
Quando o Tempra chegou ao mercado brasileiro, em 1991, trouxe inovações até então inéditas para carros de seu porte. Uma das importantes novidades eram as suspensões completamente independentes nas quatro rodas. Um avanço que permitia uma dinâmica do carro não vista em seus concorrentes. O mercado de importados estava se abrindo nessa época, e o conceito das suspensões independentes chegavam com os últimos modelos importados, bem mais caros que o Tempra.
O primeiro sedan médio da Fiat era vendido também no mercado europeu. Tinha um bom espaço interno e um refinamento construtivo que colocava o Tempra como um luxuoso. Destaque para seu enorme e elogiável porta-malas, que tinha a estupenda capacidade de 552 litros, segundo constava nas especificações do próprio manual do veículo. O motor de 2 litros e quatro cilindros, chegou ao mercado com a configuração de quatro válvulas por cilindro, totalizando 16 válvulas, ou 16V, como ficou mais conhecido, com absoluto ineditismo em 1994. Até então, os motores 16V eram restritos apenas aos carros importados.
O Tempra Ouro 16V do acervo tem pouco mais de 28 mil quilômetros rodados e foi fabricado no ano de 1995. Trata-se de um exemplar na rara configuração completa, que tinha até mesmo a sofisticação dos bancos dianteiros eletricamente ajustáveis, além da forração em couro e ar-condicionado digital. Seu motor 2.0 16V desenvolve 127c v e um torque máximo de 18,4mkgf. Até hoje, o valente Tempra Ouro 16V que não deve nada aos carros atuais de seu porte. As suspensões são firmes e o Tempra ainda roda macio e silencioso como em 1995. Outra peça muito interessante do raro acervo da Fiat.
Uno 1.5 R
Quando a Fiat trouxe o Uno para ser produzido no Brasil, trouxe com esse projeto muitas variações, que iam desde veículos comerciais, como as picapes, até versões esportivas, que serviriam até mesmo para competições. Nessa linha, a Fiat lançou em 1987 o Uno 1.5 R, uma versão esportiva do versátil carrinho, que tinha no desempenho o seu ponto alto. Mas, o pessoal do design não decepcionou àqueles que queriam uma aparência mais agressiva, descolada e jovem do Uno esporte.
Equipado com motor 1.5 Sevel, que desenvolvia 86cv, com um torque máximo de 12,9mkgf, valores mais do que suficientes para proporcionar um desempenho brilhante para o leve e ágil Uno. As relações de marchas, mais curtas do seu câmbio reescalonado, permitiam ao valente Uno 1.5 R, um desempenho antes só reservado a carros equipados com motor de maior capacidade cúbica. Equipado com calotas exclusivas até 1988, em 1989 recebeu rodas de liga-leve, também exclusivas. O Uno 1.5 R foi produzido até 1989, quando foi substituído pelo Uno 1.6 R, com motor ainda mais potente e desempenho mais brilhante.
E olha que esse Uno 1.5R do acervo da Fiat não estava para brincadeiras. No breve teste que realizamos, o hatch mostrou que ainda brilha com respostas rápidas ao comando do acelerador, como em seus bons tempos no início dos anos 90. Um carro agradável de ser conduzido, com apelo esportivo na medida certa. Tem até os cintos de segurança na cor vermelha, uma exclusividade do modelo na época. Um carro que faria muitos jovens felizes mesmo nos dias atuais.
Uno Turbo
O Uno Turbo pode ser considerado como uma das joias desse acervo. A versão Turbo foi produzida por um curto período de tempo (de fevereiro de 1994 até 1996), tornando esse carro quase uma raridade. O pequeno Uno possuía um motor 1.4 que era superalimentado por um turbocompressor Garrett T2. Com uma pressão máxima de 0,8 bar, o motor, totalmente importado da Itália, desenvolvia 118 cv e um torque máximo de 17,5mkgf. Mais do que suficiente para levar o leve Uno até os 195 km/h.
Com muito torque, pouco peso e uma pequena turbina que permitia respostas rápidas do motor, as acelerações brilhantes, beneficiavam-se ainda das curtas relações do seu câmbio de cinco marchas. De 0-100 km/h, o ágil Uno completava a prova em 9,2 segundos. Um tempo de respeito até mesmo para os dias atuais. Mas, o Uno Turbo não era apenas acelerações brilhantes e velocidade máxima impressionante: o pequeno hatch possuía outras tecnologias para permitir alto desempenho com segurança.
Na calibração das suspensões, além de novas molas e amortecedores, o carro ficou um centímetro mais baixo, garantindo mais estabilidade.
Os pneus 185/60 R14, juntamente com os maiores discos de freio (herdados do Tempra), garantiam frenagens em espaços mais curtos e alta eficiência mesmo quando muito exigidos. A carroceria monobloco teve as suas torres de suspensão dianteira amarradas através de uma barra transversal, que garantia a rigidez estrutural do conjunto. Esse recurso garantia uma dirigibilidade mais estável em curvas velozes e acelerações. Com painel de instrumentos completíssimo (Tinha um total de sete mostradores) e acabamento refinado, o Uno Turbo era um carro caro: custava cerca de três vezes mais que o Uno Mille.
O modelo do acervo que andamos estava perfeito, faltando apenas alguns pequenos detalhes de acabamento que se perderam ao longo desses 22 anos. Mas detalhes todos fáceis de serem restaurados em sua plenitude.