O Shelby Cobra é um ícone do mundo automotivo, uma combinação perfeita de chassi esportivo inglês com motor de muscle car americano. Foram feitas tantas réplicas dele que é difícil encontrar um exemplar original. Ainda mais raros são os Cobra genuínos e de um único dono. É exatamente o caso do modelo abaixo, de propriedade de Hank Williams, um americano de 72 anos que mora em Fontana, na Califórnia (EUA).

Já se passaram 46 anos desde que o jazzista aposentado e piloto pegou as chaves de seu Shelby Cobra 4.7 V8 de segunda geração. Foi o início de uma parceria de sucesso, que fez do carro um dos maiores ganhadores de troféus de corridas, ralis e exposições do mundo – foram 419 premiações. “Eu não o venderia. Não hoje”, explica Hank. Mas já apareceram muitos interessados em fazê-lo mudar de opinião. “Há um nova-iorquino que me liga a cada dois anos, desde 2001. Na última vez, ofereceu US$ 1,5 milhão”, conta. Detalhe: Hank pagou US$ 6.390,23 pelo carro, o que, em valores atualizados, daria cerca de US$ 45 mil.

Como um dos raríssimos donos de Cobra original (há menos de uma dezena), Hank tem fãs famosos, como o próprio Carroll Shelby. É dele o autógrafo na tampa do porta-luvas. O criador do modelo sempre leva Hank aos eventos que reúnem carros da marca e até o convidou para a inauguração do museu da Associação Nacional de Hot Rods em Las Vegas (EUA), em 1998. Afinal, não há Hot Rod mais original que o dele, construído pelo próprio fundador da Shelby American.

Hank não comprou o carro para participar de corridas, mas não demorou para iniciar uma carreira de dez anos nas competições. O Cobra participou de 394 eventos e conquistou 35 troféus entre eles, uma placa comemorativa por Hank ter sido o primeiro negro a competir no Circuito de Indianápolis. Mesmo com tantas corridas, os acidentes foram poucos e pequenos. “Nunca aconteceu nada grave. Não sei se fui sortudo ou se alguém lá em cima me vigiava, mas o chassi nunca foi danificado, só a carroceria”, brinca.

Mas não era apenas nas pistas que o Cobra marcava território. Dirigido cotidianamente até os anos 1970, sempre foi uma raridade nas estradas – e uma surpresa para os donos de outros muscle cars americanos. A Ford fornecia o V8 de 340 cv para Shelby porque ele queria um carro que andasse mais que um Corvette. Hank explica que ganhar rachas com ele era comum, pois a relação peso-potência do Cobra era melhor. “Foram tantos Corvette que deixei comendo poeira…”, relembra. “A maioria do motoristas nem sabia qual era meu carro. Pensavam que era um MG e, com a capota fechada, achavam que era um BMW.”

Prova do impressionante acerto de fábrica é que Hank corria com o carro quase original, adicionando apenas alguns componentes comprados diretamente da Shelby. O escape de corrida, o santantônio e o para-brisa menor foram aposentados mas, devidamente guardados, hoje são também raridades valiosíssimas.

Hank abre o porta-malas e “saca” um martelo desgastado, com a marca Thor, que era usado para encaixar os cubos de roda. Ele é parte do kit de ferramentas original que continua em seu Cobra. “Algumas pessoas matariam por essas ferramentas. São extremamente raras. Sempre ando armado para protegêlas”, conta Hank. “Uma vez um cara veio de Michigan, dirigiu quase cinco mil quilômetros apenas para fotografar as ferramentas, pois queria copiá-las”, justifica.

No porta-malas, o martelo original, raro como o carro

Outra raridade do carro é a cor azul acinzentada. Essa cor nunca foi oferecida oficialmente, mas é original de fábrica. “Ninguém sabe que cor é essa”, conta Hank. “Quando pintaram o carro, o azul tinha acabado. Então misturaram um pouco de cinza para finalizar três carros. Desses três, um já foi repintado de branco”, conta. Até o teto rígido genuíno, comprado para proteger sua noiva do frio, é raro. Em um evento realizado em 1989 Carroll Shelby ficou tão impressionado com ele que disse a Hank para deixá-lo no carro.

Pode fazer quase 40 anos que o carro parou de ser usado no cotidiano, mas o Cobra está longe de ser um modelo de exposições. Hank o leva rodando para muitos eventos nos Estados Unidos, muitas vezes ganhando prêmios por ser o participante que veio mais de longe. “Ele é devidamente pilotado”, frisa seu feliz proprietário. “Esse carro me deu mais 25 anos de vida”, diz Hank. “Eu não o idolatro, não se trata de ter orgulho. Ele é simplesmente uma parte de mim”, resume.

Depois de quase meio século juntos, a relação de Hank com o carro superou a duração de muitos casamentos e não parece ter data para acabar. O carro, assim como Hank, virou parte da história dos Shelby. Como o conceito original do carro, trata-se de uma combinação perfeita.

 

Note, acima, que Hank fez uma placa “kit não” para seu Cobra, deixando claro que se trata de um original.

 

 

 

 

 

 

À esquerda, uma de suas participações em competição.

 

 

 

 

O V8 da Ford deixava os Corvette comendo poeira