05/10/2025 - 7:00
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva autorizou o governo a seguir adiante com a discussão sobre o fim da obrigatoriedade de aulas em autoescola para a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Agora serão realizadas audiências públicas pelo Ministério dos Transportes para discutir o assunto, processo esse que deve demorar mais 30 dias.
O tema vem sendo defendido pelo ministro dos Transportes Renan Filho nos últimos meses, com o objetivo de reduzir os custos para tirar a habilitação. O governo ressalta que, atualmente, cerca de 20 milhões de brasileiros dirigem motos e carros sem carteira de habilitação, e que para obter uma CNH, o cidadão pode ter que gastar até R$ 3,2 mil.

A ideia da proposta é que o candidato possa escolher diferentes formas para se preparar para os exames teórico e prático, que continuarão obrigatórios como condição para a emissão da CNH. As aulas, práticas e teóricas, poderão ser dadas por instrutores autorizados para isso.
O projeto também prevê o uso de soluções tecnológicas, como plataformas online que conectem candidatos e instrutores, semelhantes a aplicativos de mobilidade. Essas ferramentas poderão oferecer agendamento, geolocalização e pagamentos digitais, para citar.
O objetivo é “modernizar o sistema atual, garantindo mais liberdade e economia aos futuros motoristas, sem abrir mão das exigências de segurança viária”, afirmou o governo federal em nota.
A proposta tem como inspiração as práticas de países como Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, Japão, Paraguai e Uruguai, onde os modelos de formação são mais flexíveis e centrados na autonomia do cidadão.

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Próximos passos da proposta para obter a habilitação
A minuta do projeto ficará disponível por 30 dias na plataforma Participa + Brasil, e depois seguirá para análise do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Durante o período, o cidadão poderá enviar sugestões e contribuições.
Como vai funcionar a nova proposta?
A abertura do processo para a obtenção da habilitação será feita diretamente pelo site da Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran) ou por meio da Carteira Digital de Trânsito (CDT).
Após isso, o cidadão não dependerá, necessariamente, das autoescolas. O conteúdo teórico poderá ser estudado de forma presencial nos CFCs, por ensino a distância em empresas credenciadas ou, em formato digital, oferecido pela própria Senatran. O novo modelo retira a exigência de carga horária mínima de 20 horas-aula práticas.
A proposta também prevê a facilitação dos processos de obtenção da CNH para as outras categorias: C (veículos de carga, como caminhões), D (transporte de passageiros, como ônibus) e E (carretas e veículos articulados).
Tirar uma CNH ficará mais em conta?
Segundo o governo federal, com o novo modelo, o custo para obtenção da CNH poderá cair em até 80%. A redução engloba a ampliação das formas de oferta da formação teórica, inclusive contando com formatos digitais, e a dispensa da carga horária mínima nas aulas práticas.
Como será o procedimento para credenciar instrutores autônomos?
O governo diz que os instrutores deverão ser credenciados pelos Detrans. A Senatran permitirá a formação desses profissionais por cursos digitais, mas que seguirão critérios rigorosos definidos pelos Detrans e pela Senatran. Haverá conteúdos padronizados, avaliação final obrigatória e controle digital.
Nenhum profissional poderá atuar sem credenciamento oficial e serão identificados digitalmente na Carteira Digital de Trânsito (CDT).
O que dizem as autoescolas?
O fim da obrigatoriedade das autoescolas poderá gerar um impacto de R$ 14 bilhões no faturamento do setor, além da ameaça a 300 mil empregos. É o que aponta um levantamento da Federação Nacional das Autoescolas e Centros de Formação de Condutores (Feneauto).
De acordo com Ygor Valença, presidente da entidade, haveria um desmonte da rede, estruturada ao longo de quase três décadas, que hoje garante segurança viária, empregos formais, arrecadação de tributos e recursos para políticas sociais e habitacionais em todo o território nacional.
Atualmente, o setor de formação de condutores no Brasil conta com 15.757 CFCs em operação e movimentam uma massa salarial de R$ 429 milhões por mês.

Impactos econômicos e fiscais
Como dito acima, além da perda imediata de R$ 14 bilhões por ano do faturamento do setor, haveria um declínio de R$ 1,92 bilhão de arrecadação tributária. Hoje, a legislação impõe como exigência o credenciamento dos CFCs, assim como a regularidade fiscal e tributária, ou seja, o pagamento de impostos.
O efeito dominó se alastraria, sobretudo, nos municípios médios e pequenos, os quais experimentariam queda do consumo local e declinação de arrecadação de ICMS e ISS, diz a entidade. O custo social relativo à subida de sinistros de trânsito pode encarecer ainda mais o dano, pois os acidentes correspondem a cerca de 3% do PIB nacional.
Impacto no SUS
A federação alerta também para o possível aumento em mortes e vítimas no trânsito. Estudos da OMS e da OPAS demonstram que o treinamento estruturado de condutores é fator determinante para reduzir acidentes, hospitalizações e mortes. O Brasil registra 33 mil mortes anuais.
“Estamos diante de uma proposta que ameaça não apenas o setor, mas a sociedade como um todo. Desmontar a rede de CFCs significa abrir mão de empregos, de arrecadação e, principalmente, da segurança no trânsito. O Brasil ainda convive com números alarmantes de mortes em acidentes, e flexibilizar a formação de condutores é retroceder em décadas de conquistas. A preservação dessa rede não é uma pauta corporativa, é uma questão de interesse público”, argumenta Ygor Valença, presidente da Feneauto, à imprensa.