24/05/2025 - 18:00
Estávamos no início 1993, mais precisamente em janeiro. O ano estava só começando. Eu, Douglas Mendonça, e meus companheiros de trabalho e amigos, Eduardo Pincigher e Bob Sharp, tínhamos uma grande missão: mostrar aos nossos leitores, em números e resultados, qual era o melhor esportivo nacional entre as três grandes fabricantes do nosso mercado. As estrelas: Gol GTi, Kadett GSi e Escort XR3.

Eu assinaria a matéria. Mas, pela grandiosidade do trabalho, deveria contar com a ajuda dos dois experientes jornalistas, e também pilotos, para chegarmos a uma conclusão definitiva de qual era o melhor esportivo brasileiro.
Nesta época, o valente motor do Gol GTi, um 2.0 de 8 válvulas, era destaque pelo torque abundante desde as baixas rotações, e movia com facilidade a leve carroceria do Golzinho esportivo. O carro era absolutamente equilibrado, facílimo de ser pilotado, até mesmo por inexperientes motoristas. Uma delícia!
No Kadett GSi, a GM ainda mantinha fresca as novidades como a injeção eletrônica em seu motor 2.0, além de um reescalonamento nas relações de marchas do câmbio. Realmente essas mudanças fizeram do antigo Kadett GS, um verdadeiro GSi. O Chevrolet também ostentava o motor mais potente nessa briga de titãs, um 2.0 de 121 cv, contra apenas 112 cv do Gol GTi. Mas, como sabemos, a maior potência não é sinônimo de maior desempenho em um carro, principalmente em um esportivo. Outros fatores acabam pesando.
Finalmente tínhamos nesse comparativo, a verdadeira estrela para quem gosta de esportividade: o Escort XR3 chegava tinindo com uma nova carroceria de design supermoderno, e, no cofre, um motor semelhante ao do Gol GTi.

Eu explico! Na época do lançamento do XR3 de segunda geração, ainda existia a Autolatina, uma empresa que fundia interesses entre Volkswagen e Ford. Nessa parceria, eles trocavam entre si carrocerias, plataformas e mecânica. Muito produto feito na fábrica da VW era vendido nas concessionárias Ford com marca americana impressa nos carros alemães, e vice-versa.
O novo XR3 tinha carroceria do Ford recém-lançado na Europa, mas com o motor e câmbio da VW. O interessante é que no Escort, o mesmo motor do GTi desenvolvia 3 cv a mais, graças à disposição transversal, que, nesse caso, ainda resultava em novos coletores de admissão e escapamento, melhorando a performance.
Pois bem, vamos voltar agora para o início do ano de 1993, quando avaliamos os três esportivos. Além dos testes convencionais (aceleração, velocidade máxima, retomada de velocidade, aderência lateral em curvas, consumo de combustível na estrada e na cidade), resolvemos levar os esportivos para o Autódromo de Interlagos, um ambiente bem propicio para essas feras.

Depois que fizemos todos os trabalhos de pista medindo o tempo de volta de cada carro com cada piloto, no final do dia, o experiente piloto Bob Sharp sugeriu uma “corridinha” entre os três. Emparelhamos os esportivos na linha de largada. De comum acordo, eu pilotava o Gol GTi , Pincigher pilotaria o Kadett GSi e o Bob ficaria ao volante do novo XR3.
Largamos os três ao mesmo tempo, mas o GTi, mais leve, chegou na frenagem do S do Senna já com um carro de vantagem sobre os seus adversários. Percebi, logo de cara, que seria uma barbada para o Gol GTi! A nossa corrida de compadres seria de apenas uma volta, e quem a completasse primeiro, seria declarado o vencedor. Na descida da curva do lago eu já tinha mais de dois carros sobre o Kadett GSi, que nessa altura do campeonato, já começava a se livrar do XR3, terceiro colocado.
Pelo visto, eu não encontraria dificuldades em dar a vitória para o Gol GTi, afinal de contas o mérito era todo do carro alemão. Ao volante, eu não tinha habilidade superior ao dos meus parceiros.

Mas, sabe aquela história da ganância? Pois bem, eu querendo abrir uma distância ainda maior para o segundo colocado Kadett, fui além da conta na curva do Laranjinha, e perdi a traseira. O Gol GTi atravessou, mas como é um carro dócil e fácil de pilotar, um contra-esterço recolocou o VW na trajetória.
O problema é que perdi muito tempo nesse descontrole, e o Kadett, que estava quase a três carros atrás, teve a oportunidade de praticamente me ultrapassar. Edu Pincigher, guiando o Chevrolet, quando viu o Gol GTi atravessando, viu a oportunidade de tomar a liderança. Acelerou forte o Kadett e, adivinhem? Também atravessou! No final, ele perdeu o mesmo tempo que eu, recolocando seu GSI na trajetória.
A vantagem dos três carros foi mantida pelo Gol GTi. O restante do circuito da pista foi feito de boa, com os pés nas costas. Percebi que seria bobagem forçar, com risco de cometer outro erro. Cruzei a linha de chegada com quase quatro carros de vantagem sobre o Kadett GSi.

Você deve estar perguntando: “cadê o XR3?” Na realidade, esse Ford era um pré-série e apresentava um sério problema de soltar a borracha da barra estabilizadora quando era muito exigido. Segundo os relatos do Bob Sharp na época, logo na segunda ou terceira curva, a barra estabilizadora dianteira soltou-se e o carro ficou completamente desequilibrado, dificílimo de ser conduzido esportivamente. Uma pena!
Esse pequeno tira-teima mostrou, na realidade, quem era o rei das pistas e para nós jornalistas especializados. Ali ficou mais do que claro que, antes de potência de motor, fala mais alto o equilíbrio em curvas e frenagens, e a rapidez das retomadas de velocidades nas saídas de curvas. E o Gol GTi, equilibrado e com bom freio, chegava rápido nas tomadas de curva. Era a receita perfeita de um esportivo de estirpe.