LÓGICA INVERTIDA

Os dados de consumo urbano divulgados pela Ford (obtidos em testes que seguem as normas-padrão) e os resultados de nosso teste prático: o grande e confortável sedã inverteu a lógica e gastou menos que o pequenino 1.0

 

 

 

á um ano, um comparativo entre Fusion e Ka seria algo impensável. A única característica em comum desses dois carros era o fato de serem fabricados pela Ford. Mas o lançamento da versão híbrida do sedã aproximou os modelos em mais um quesito: o consumo de combustível. Essa realidade nos permitiu fazer um teste curioso: rodamos com os dois modelos, na mesma condição, por cerca de 30 km em meio ao trânsito. A ideia era descobrir qual deles é o mais eficiente em consumo de combustível e emissão de poluentes.

A primeira parada foi no posto de combustível, onde abastecemos os dois modelos e calibramos seus pneus de acordo com as recomendações do manual do proprietário. Hodômetros zerados, partimos para um circuito urbano típico da cidade de São Paulo. O Fusion sempre rodou na frente, para que impusesse o ritmo – já que exige uma forma de condução diferente (leia quadro na página 23). Pegamos o elevado Costa e Silva (o famoso Minhocão, na foto ao lado) do Parque da Água Branca à rua da Consolação. Cruzamos a avenida Rebouças, retornamos na marginal do Pinheiros e, em frente ao Shopping Eldorado, trocamos os motoristas para igualar a forma de condução dos modelos. Seguimos novamente pela Rebouças, percorremos toda a avenida Paulista e chegamos à avenida 23 de Maio, de onde voltamos ao elevado rumo ao posto de combustível do início do teste. Na mesma bomba, reabastecemos os modelos e descobrimos quanto cada um deles havia consumido de gasolina durante o percurso. Para anular o erro dos hodômetros, somamos a quilometragem marcada nos dois carros e tiramos a média. Chegamos a um percurso de 34 km. O resultado do teste impressionou: o Fusion rodou 16,2 km/l e o Ka, 13,2 km/l – números excelentes em ambos os casos.

Esse teste nos faz chegar a algumas conclusões e suscita discussões a respeito das novas tecnologias para diminuição de consumo dos automóveis. Vamos esquecer a enorme diferença de preços dos modelos por um instante (o Fusion é R$ 108.480 mais caro). A primeira conclusão é de que não precisamos necessariamente ter um carro com desempenho sofrível (o Ka nem é dos piores!) para alcançar boas marcas de consumo. Isso é fato. Em um curto espaço de tempo, a tecnologia deverá resolver essa equação. Um motor a combustão convencional como o do Ka, por exemplo, tem uma eficiência energética em torno de 27%. Isso significa que, de cada dez litros de combustível que você coloca no tanque, apenas 2,7 litros, em média, viram energia para movimentar o carro. Os outros 7,3 litros são desperdiçados.

Se o Fusion marcou mais de 16 km/l, imagine um Ka 1.6 híbrido: o alto custo hoje o torna impraticável, mas em alguns anos…

Atualmente, a indústria vem buscando melhorar esses índices com a aplicação de diversos recursos, pesquisando o uso de materiais mais resistentes e leves, aperfeiçoando os sistemas de alimentação e exaustão, a dinâmica da combustão dentro da câmara e usando artifícios como turbocompressores, recuperadores de energia de frenagem, startstop (desliga o motor com o carro parado) e combustíveis alternativos. E os resultados começam a aparecer em carros como o Fusion Hybrid. Se pensarmos no consumo dos modelos desse teste, considerando o porte, veremos que a vantagem do Fusion aumenta ainda mais. O sedã da Ford tem uma área de 8,9 m2 e peso de 1.687 kg. O Ka, com 6,3 m2 e 943 kg, é cerca de 30% menor e 44% mais leve. Considerando só a vantagem do menor peso – ignorando que um oferece 158 cv e o outro 70 cv – o Ka teria que ter gasto, no mínimo, 40% a menos que o Fusion, quando, na realidade, gastou 19% a mais. Ou seja, o compacto 1.0 foi quase 60% menos eficiente. Fusion e Ka são extremos opostos, é verdade, mas a realidade desses modelos está convergindo para um ponto único. Em alguns anos, teremos carros mais confortáveis e com bom desempenho, mas com medidas compactas e equipados com motores menores e flexíveis.

Ka e Fusion circulam pela rua da Consolação e pelas avenidas Paulista e Rebouças. Quanto pior o trânsito, melhor para o híbrido: o motor desliga nas paradas e as acelerações suaves usam apenas o motor elétrico

 

Outra observação a ser feita é em relação à emissão de dióxido de carbono (CO2), principal causador do efeito estufa. Durante nosso teste, Fusion e Ka emitiram, respectivamente, 4,56 e 5,58 quilos de CO2. Se ambos estivessem rodando com etanol, essa emissão seria considerada nula, já que a plantação da cana-de-açúcar consome praticamente todo o dióxido de carbono emitido na produção e no consumo do etanol. O Ka oferece a possibilidade de ser abastecido com o combustível verde – e o Fusion não. Hoje, no mundo, ainda não temos híbridos de produção em série que possam usar só etanol, e isso precisa ser revisto. Grande parte da energia elétrica que o mundo usa vem de fontes sujas como o carvão. Um carro elétrico plug-in (carregado na tomada), dependendo de onde é abastecido, pode ser tão danoso ao meio ambiente quanto um movido a gasolina. No Brasil, temos o cenário ideal. Nossa energia vem de hidrelétricas e temos farta produção de etanol. Para nós, um carro híbrido realmente limpo, seja ele plug in ou não, é uma realidade bastante palpável. Ou seja, tecnologias modernas como as do Fusion não devem demorar para chegar aqui. Em princípio, com preços quase proibitivos, como é o caso do sedã dessas páginas. Mas a popularização desses modelos pode ser mais rápida do que pensávamos.

Colaboraram: Rafael A Freire e Bruna Marconi

Acima, o motor 2.5 a gasolina do Fusion com a identificação Hybrid: os componentes do sistema elétrico ficam escondidos

Abastecemos os carros na mesma bomba e depois calibramos todos os pneus conforme a recomendação do manual do proprietário

Aprendendo a dirigir Fusion Hybrid

Um modelo híbrido como o Fusion precisa ser conduzido de forma diferenciada para que se obtenha o melhor de sua tecnologia. O carro tem displays com um monte de recursos para ensinar ao motorista como dirigir economicamente. Se não quiser entrar na brincadeira, acelere e terá um carro quase tão gastão quanto qualquer 2.5 quatro cilindros a gasolina. Se quiser economizar e ajudar a reduzir o impacto do uso do carro no planeta, siga algumas regras básicas e curta a experiência. Pode ser um bom passatempo em meio ao trânsito caótico das cidades.

– Acelere normalmente, pisando de leve no pedal. Quando chegar à velocidade desejada, tire o pé do acelerador e depois acelere novamente, bem de leve, observando o limite da linha verde sobre o indicador EV. É possível manter uma velocidade constante de até 65 km/h por um bom tempo – usando só eletricidade.

– Ao ver um sinal fechando ou o trânsito parando, tire o pé do acelerador e não freie. Deixe-o recuperar o máximo de energia da desaceleração. Depois, comece a frear de leve, observado o símbolo de recuperação de energia sobre o indicador de carga da bateria. Só pise no freio até o final para a parada completa.

– Mantenha o pé sempre bem leve no pedal direito e não use o acelerador em descidas. Não adianta usar a banguela, pois assim você não recupera energia para as baterias. Nunca acelere muito, pois isso faz o carro usar os dois motores ao mesmo tempo, gastando energia da bateria quando não é necessário.

– No trânsito pesado, acelere sempre bem de leve e sem pressa, observando, como sempre, o limite da linha verde sobre o indicador EV. Assim é possível ganhar velocidade sem usar gasolina e aproveitar ao máximo a energia elétrica armazenada.