No dia 6 de outubro vai fazer 40 anos que Emerson o dia 6 de outubro vai fazer 40 anos que Emerson 1 para o Brasil. Por isso, MOTOR SHOW fez uma entre vista exclusiva com o bicampeão para lembrar detalhes do Mundial de 1974. Emerson trocou a JPS Lotus pela Marlboro McLaren no nal de 1973, magoado porque o chefe da equipe, Colin Chapman, não deu ordem ao sueco Ronnie Peterson para deixá-lo vencer a corrida de Monza, o que manteria suas chances  de ser bicampeão. Emerson lembra os detalhes desse episódio, traz bastidores sobre sua negociação com a McLaren, compara a Fórmula  1 daquela época com a F1 de hoje, revela o drama que foi a morte  de seu companheiro na Lotus, Jochen Rindt, em 1970, e conta como venceu a disputa com Clay Regazzoni, da Ferrari. 

MOTOR SHOW – Em que momento você decidiu sair da Lotus?

EMERSON FITTIPALDI – Olha, foi exatamente no Grande Prêmio da Itália em Monza. Antes do Grande Prêmio tínhamos combinado com o Colin que, se eu e o Ronnie estivéssemos liderando a corrida e longe do terceiro, não iríamos atacar um ao outro, e faltando 15 voltas o Colin daria sinal para a gente trocar de posição, se o Ronnie estivesse na frente, para eu ganhar porque tinha chance de ser campeão mundial. Tudo concordado, tudo certo, começou a corrida e aconteceu exatamente como tínhamos imaginado. Nós abrimos e, quando estávamos na volta 15 para acabar, eu e o Ronnie olhávamos paraver se tinha sinal e não tinha sinal do box. Aí eu esperei até faltarem dez voltas. Como não veio sinal do box, eu pensei: “Vou atacar.” Comecei a atacar, o Ronnie passou a se defender, e terminei a corrida com o nariz do meu carro no câmbio dele. Quase batemos duas ou três vezes nas freadas de chicanes. Quando terminou a corrida, saí do carro muito louco porque o Colin não fez o que prometeu e pensei sei comigo: “Perdi hoje a chance de ser campeão mundial. Vou procurar outra equipe.”

MS – Você falou com eles após a corrida?

EF – O Ronnie não tinha culpa nenhuma! Cobrei do Colin e ele disse: “Ah, eu achei melhor não dar sinal para vocês.” E eu falei: “Colin, acabei de perder a chance de ganhar o campeonato mundial!” Não era uma corrida no começo, era o fim da temporada, faltavam só três grandes prêmios: Monza, Canadá e Estados Unidos. Eu ainda tinha chance de ganhar. Em corrida pode acontecer qualquer coisa. Na última volta o motor do Jackie Stewart poderia quebrar. A partir daí eu voltei para a Suíça. E, coincidentemente, o pessoal da Philip Morris, que também morava na Suíça e eu sempre encontrava no avião, estava no mesmo voo depois do Grande Prêmio. O Patrick Dufller, que era gerente de desenvolvimento esportivo da Philip Morris na Europa, chegou em mim e disse: “Emerson, nós queremos conversar com você. Queremos sair da BRM, porque a equipe está muito mal. Nós queremos contratá-lo e você pode escolher a equipe. A escolha é sua, escolha quem você quiser.”

MS – E o que você fez?

EF – A primeira equipe em que fui conversar foi a Brabham, com o Bernie [Ecclestone]. Eu gostei muito, quase assinamos com ele. Depois eu fui visitar a Tyrrell e também a McLaren. A que mais me impressionou em termos de organização foi a McLaren. E o M23 era um carro muito bom.

MS – Eles sabiam que você estava levando a Marlboro?

EF – Sabiam. Eu já chegava oficialmente com o pessoal da Philip Morris. E ao mesmo tempo o Colin estava desesperado para eu continuar na Lotus. Ofereceu o dobro do meu salário para continuar na equipe, mas eu falei: “Colin, o meu negócio é tentar ganhar o campeonato mundial e eu vi que, ainda com chance de ser campeão, você tirou essa chance de eu ganhar o campeonato mundial. Então não vou continuar com você.” Ele ficou arrependido do que fez, mas eu não voltei atrás.

MS – Você ficou chateado com o Ronnie por causa disso?

EF – Nunca! O Ronnie era um dos maiores amigos meus, imagina! Se eu estivesse no lugar dele, faria a mesma coisa.

MS – Com quem falou na McLaren?

EF – Com o Teddy Meyer. E também com o Phil Keer, um neozelandês que era muito amigo do Bruce McLaren [ex-piloto e fundador da equipe]. E falei muito com o Dennis Hulme, que já era piloto da McLaren, sobre o carro, o M23. Eu gostetambém porque naquela época 80% da McLaren era neozelandês. E eles tinham o mesmo entusiasmo que nós, brasileiros, quando  vamos para um continente diferente. Você está lá para fazer aquilo, para ganhar. Senti uma energia boa na McLaren, muita organização. E o carro era excelente. Assinei com a McLaren e o Bernie ficou chateado. Ken Tyrrell não tanto, mas o Bernie realmente ficou chateado porque ele queria que eu fosse para a Brabham.

MS – Quem projetou o McLaren M23?

EF – Foi o Gordon Coppuck. Mas o assistente dele na época, que o ajudou a desenhar o M23, era um jovem chamado John Barnard, que mais tarde fez muito sucesso na Fórmula 1 com a própria McLaren
e com a Ferrar.

MS – E sua primeira vitória na McLaren veio justamente em Interlagos…

EF – Foi muito bom porque era o segundo Grande Prêmio no Brasil e eu venci um com a Lotus e o outro, com a McLaren. Mas eu poderia ter conseguido um bom resultado logo na estreia, no GP da Argentina,
que foi vencido pelo Dennis Hulme. Naquela época, como o risco de incêndio era muito alto, o botão da chave geral era grande para ser facilmente alcançado dentro do cockpit. Mas acabei batendo a mão no botão que desligava a chave geral no meio da corrida e simplesmente o carro parou. Se não fosse isso, eu poderia ter conseguido um bom resultado logo na corrida de estreia. 

MS – Como você conseguiu se manter à frente de Niki Lauda para vencer o GP da Bélgica? Ele o perseguiu implacavelmente e sua Ferrari parecia ser mais rápida.

EF – Eu sabia que a chance que ele tinha de me ultrapassar era na reta, então eu já vinha defendendo a posição desde a curva anterior, freando antes e o obrigando a frear para acelerar antes dele também. E na reta eu já vinha defendendo a posição, freando por dentro, para deixar o lado de fora para o Niki.

MS – Qual foi a corrida mais importante da temporada de 1974?

EF – Nós tínhamos muita dificuldade com o McLaren M23 em toda pista ondulada. O carro seira. Então a McLaren fez uma geometria de suspensão totalmente nova para Brands Hatch [GP da Inglaterra] Aquela foi uma corrida- chave. Tecnicamente o carro ficou muito bom. Eu terminei a corrida em segundo lugar e saí de Brands Hatch como líder do campeonato. 

MS – Que carro era melhor de guiar: o Lotus 72 ou o McLaren M23?

EF – O M23 era muito bom, principalmente depois das modificações que recebeu em Brands Hatch, mas eu acho que o melhor carro de corrida que já guiei foi o Lotus 72.

MS – Naquela época o preparo físico era tão importante como hoje?

Era. Já tinha uma turma muito boa se preparando. Todos os caras que andavam na frente tinham boa preparação física. O volante era pesado, não tinha direção assistida. Com o tanque cheio, então, o volante ficava bem mais pesado.

MS – Ao ganhar seu segundo título mundial, você tinha apenas 27 anos. Até onde você imaginava que iria chegar?

EF – Pouca gente sabe disso, mas quando ganhei o primeiro mundial eu voltei pra casa, fui para o meu pai e para o meu irmão e disse: “Vou parar!”

MS – Que traumas?

EF – Quando entrei na Lotus, em 1970, eu já tinha convivido com o Jochen [Rindt, morto no GP da Itália daquele ano]. Quando fui morar na Suíça, ele e o Jackie Stewart me ajudaram a arrumar casa. A gente corria na Fórmula 2 juntos. Apesar do espaço de tempo pequeno, eu tive um convívio com o Jochen e com a mulher dele. A morte dele foi um choque para mim e para minha mulher. E a partir dali ficava aquele negócio na cabeça.

MS – O que você lembra do acidente do Jochen?

EF – Antes da corrida de Monza, o Colin pediu para eu amaciar o carro que o Jochen ia guiar, que era o Lotus 72 zero. Nunca tinha andado. A gente corria com o Lotus 49. Saí sem aerofólio, apenas para amaciar. E eu estava muito rápido na reta que antecede a Curva Parabólica. Olhei no retrovisor porque o [Jack]  Brabham vinha atrás de mim. Mas, quando freei, eu estava a uns 100 km/h além da velocidade que eu deveria estar. Nisso o [Ignazio] Giunti, da Ferrari, estava Brabham vinha atrás de mim. Mas, quando freei, eu estava a uns 100 km/h além  da velocidade que eu deveria estar. Nisso o [Ignazio] Giunti, da Ferrari, estavafazendo a curva, mas eu vim e passei com a Lotus por cima do pneu do carro dele. Praticamente passei por cima da Ferrari, saí da pista num trecho que tinha uns 50 ou 60 metros, daí subi num barranco e o carro caiu em cima das árvores. Não capotei porque uma árvore me parou. O carro ficou de pé, preso nas árvores. Eu destruí o carro. Quando voltei para o box, o Colin olhou para mim e disse: “O que aconteceu, Emerson?” Falei para ele: “Fuck up! I fucked up!” Acabou, fiz m… E foi duro eu falar, porque estava entrando na equipe e destruí o carro novo do Jochen, que liderava o campeonato, na primeira saída. Daí o Jochen ficou com o carro que eu ia guiar, o Lotus 49. E numa freada antes da Parabólica o carro quebrou o semieixo, rodou e bateu com o Jochen no guard-rail. Então, é o destino. Aquele carro era para ser o meu. Mas será que eu ia frear como ele freava? Não, eu não freava como ele freava. Será que com a minha força no pedal o semieixo também iria quebrar? Pode ser. Ninguém sabe. Foi um choque para mim

MS – Voltando a 1974, como foi a decisão contra Clay Regazzoni em Watkins Glen?

EF – Olha, aquela foi a única vez na minha vida que eu não dormi por causa de uma corrida. Nós chegamos ao Grande Prêmio dos Estados Unidos empatados em pontos. E o meu carro não estava bom naquela corrida. Nós não conseguimos um bom acerto e acabei ficando só em oitavo na classificação. Mas, para minha sorte, a Ferrari também não conseguiu andar rápido e o Clay ficou em nono lugar. Então ficamos próximos no grid. E o Clay dirigia de forma bastante perigosa. Vários pilotos reclamavam dele. Por isso também eu estava muito preocupado Na largada ele veio para cima de mim, como eu já esperava, e tive que colocar duas rodas na grama Ele achou que eu ia tirar o pé para não bater, e normalmente era isso mesmo que eu faria, mas naquele dia eu pensei: “Se tiver que bater, vamos os dois para fora.” Então continuei acelerando e coloquei a minha roda dianteir entre as duas rodas dele. Aí ele se assustou, porque não esperava minha reação, e tirou o pé, senão íamos bater. Eu saí na frente dele e nunca mais vi o Clay Regazzoni.