Um megaevento, mas bastante restrito, marcou a apresentação da última geração do Land Rover Discovery 3 modelo 2008. Durante os meses de agosto e setembro, a marca inglesa convidou 90 jornalistas de todo o mundo – dos quais apenas quatro brasileiros – para experimentar as características do veículo em um roteiro especialmente selecionado, na região noroeste da Argentina.

O percurso de 650 km, com trechos de dificuldade variável, foi percorrido em três dias. A rota foi levantada cuidadosamente, meses antes, com o mapeamento de todas as possibilidades de estradas, caminhos, hospedagens, acampamentos, abastecimento de combustível, locais para fotos e opções para possíveis casos de emergência, na região entre Salta e a divisa com o Chile, na Cordilheira dos Andes. Todas as informações coletadas foram transformadas em um roteiro e programadas em aparelhos de GPS instalados nos oito carros participantes, cada um tripulado por dois jornalistas. Durante todo o percurso, a caravana foi acompanhada por cinco veículos de apoio e uma ambulância, levando uma equipe de 20 pessoas ligadas à fábrica, vindas da Inglaterra, dos Estados Unidos e da Alemanha.

Depois de chegar a Buenos Aires, a equipe viajou para Salta a bordo de um avião Brasília. De lá, seguiu em comboio para a cidade de Cafayete, ponto de partida da aventura pela Ruta Nacional 40

Considerado um dos melhores utilitários esportivos do mundo, o Discovery 3 reúne todas as características necessárias para enfrentar os caminhos mais duros e acidentados com um impressionante nível de conforto e comportamento no asfalto. Os carros usados para a viagem eram veículos de série, que receberam apenas rodas menores, com pneus de perfil mais alto tipo mud (lameiros), rádios-amadores e GPS.

Abaixo, saímos da estrada principal para seguir margeando o rio

Nos percursos mais dificeis, contamos com a ajuda da equipe

O motor é um V6 diesel turbinado de 2,7 litros, com 190 cv e torque bastante elevado (44,9 kgfm). Toda essa potência é gerenciada, antes de chegar às rodas, por um câmbio automático de seis marchas, que possibilita, no modo command shift, que o condutor possa fazer a seleção manualmente. A tração é integral permanente, com a força distribuída entre as rodas conforme a necessidade por um sistema informatizado, o que assegura a melhor aderência possível. Aliás, praticamente tudo no Discovery 3 é comandado eletronicamente, da resposta ao acelerador à altura da suspensão. Em terrenos muito escorregadios, o diferencial central é bloqueado automaticamente.

Descanso em Colomé, após o primeiro dia da trilha

Para quem não tem prática na condução fora-deestrada, o veículo oferece um sistema extremamente prático de setup, batizado pela fábrica de Terrain Response. Através de um botão rotativo, o motorista precisa apenas escolher um entre cinco modos de operação: uma programação genérica, outra para terrenos escorregadios (grama, neve e cascalho) e três outras para situações mais radicais, como lama, areia e transposição de rochas. A partir da escolha, o programa ajusta a altura da suspensão, a resposta do motor, o sistema de controle de descida (que limita a velocidade automaticamente), o controle eletrônico de tração e os ajustes da transmissão e diferenciais.

Com quase seis mil metros acima do mar, a qualquer época do ano os visitantes encontram neve nesta região da Argentina conhecida como Nevado del Acay

Nossa primeira base e local de saída é a cidade de Cafayate, local onde os jesuítas plantaram alguns dos primeiros vinhedos da Argentina. Na cidade e em todo o Vale do Rio Calchaquí, que seguimos até o pé da Cordilheira, é produzida uma variedade de uvas, única no mundo, a Torrentés, utilizada nos vinhos da região, respeitados em todo o mundo. O caminho principal, pela Ruta Nacional 40, passa por Molinos, com suas ruínas jesuítas, Cachi e Pucará, povoados pré-colombianos de forte influência inca.

Na descida de volta a Salta, uma parada em Santa Rosa de Tastil, um sítio arqueológico onde viveram índios entre 1336 e 1479

Os traços diferentes dos que marcam o povo argentino…

Em Pucará, compramos um pão preparado com receita e ingredientes tradicionais dos índios chicoanos, desde antes da chegada dos espanhóis. Para fazer o “bolo”, como é chamado esse tipo de pão, assado num forno a lenha, são misturados farinha de trigo, milho, sal e água.

O Land Rover enfrentou bem os terrenos alagados, a areia fofa e os paredões… Mas a falta de entrosamento de um dos pilotos com o carro acabou nos custando uma pausa para reboque

Em um vale formado por um rio seco, perto de Cachi, paramos para o almoço, onde comemos os tais “bolos” com frios, queijos, atum e tomates-secos. Seguimos por esse caminho, os carros enfrentaram todos os desafios dignos de uma verdadeira aventura 4×4. Os Discovery tiveram que passar por pedras soltas, cânions estreitos, subidas íngremes, paredões inclinados, locais de areia fofa e alagados até terminarem o primeiro dia em Colomé. Quando chegamos cansados ao acampamento, já estavam nos esperando com sopa quente, churrasco, vinho e fogueira

No topo de Abra del Acay, a cinco mil metros de altitude, a foto do ponto de chegada. Os Land Rover alcançaram o ponto mais alto da América do Sul onde um veículo pode trafegar. O ar rarefeito provocou mal estar na equipe

Rumo aos vulcões Gemelos

O segundo dia seria o mais difícil de todos. Já na saída do acampamento, a areia fofa dificultava o movimento dos carros. Passamos por La Poma, ao lado dos vulcões Gemelos. A cidade original, com suas casas de adobe e tetos de palha, foi totalmente destruída por um terremoto em dezembro de 1930.

No segundo dia, a caravana enfrentou o trecho mais difícil da viagem. Além de terem que passar pela estrada mais alta da América do Sul, a caminho de Abra del Acay a areia fofa dificultava a viagem

Subindo, vamos para a montanha Abra del Acay, a estrada mais alta da América do Sul, 4.895 m acima do nivel do mar. Mesmo nesta época do ano, ainda vemos neve no Nevado del Acay com 5.950 m acima do mar.

Saímos da estrada e seguimos para marcar nos GPS a altitude de 5.000 metros e fotografar. Mas não pudemos fazer muitas imagens. É que o ar rarefeito provocou mal – estar em muitos de nós e várias pessoas da expedição precisaram de oxigênio para voltar ao normal. Esse distúrbio, chamado na região de “La Puna”, é causado pela diminuição de oxigênio que, por conseqüência, prejudica a oxigenação no cérebro. Um inconveniente esperado, mas desagradável.

Além dos Discovery dos jornalistas, o comboio era composto por mais cinco veículos, que levavam a grande equipe de apoio

Descemos para pernoitar em San Antonio de Los Cobres, uma cidade de mineiros e descendentes dos índios coya. Nas proximidades da cidade, existe um magnífico viaduto ferroviário chamado “La Polvorilla” construído na década de 30 a mais de 4.000 metros acima do nível do mar. De San Antonio de Los Cobres vamos para Salta por uma estrada secundária, acompanhando a Ruta Nacional 51 e a linha férrea do “Tren a las Nubes”. Essa ferrovia, que ligava Salta até Antofagasta, no litoral do Chile, demorou 20 anos para ser concluída. Mil trabalhadores, escavando pedras com ferramentas simples, enfrentaram muito vento, neve e gelo até a sua conclusão.

Existe um trem turístico que faz o trajeto Salta-San Antonio na época de temporada. Na parte plana da estrada, quase no asfalto, uma vasta área com enormes cactos chama a atenção. Essas plantas, de todos os tamanhos, com suas penugens refletindo o dourado do sol, as serras e montanhas sem vegetação, os tons vermelhos, verdes e cinzas da terra, parecem mais uma pintura do que uma paisagem real. Será difícil esquecer essa paisagem da Quebrada Del Toro.

Nossa próxima parada, é em Santa Rosa de Tastil, local onde existe um sítio arqueológico. Estudos indicam que ali viveram cerca de 2.200 índios entre 1336 e 1479. A próxima e última cidade antes da chegada a Salta é Campo Quijano, que se intitula “El Portal de los Andes”. Sua estação ferroviária e a locomotiva a vapor que está estacionada na praça mostram a importância da cidade no apoio para quem vai seguir até a Cordilheira dos Andes. Mais 20 quilômetros de asfalto e chegamos a Salta, final do roteiro.

Excelente momento para apreciar alguns pratos locais, que são conhecidos em todo o país e pelo mundo. Muitas receitas são provenientes dos tempos coloniais e têm influência espanhola e indígena, com o uso de milho, batata e carnes de cordeiro, cabrito e lhama. Bom prêmio no final da jornada.