Tanto o Chery Face quanto o Fiat Uno fogem dos padrões quando o assunto é design. O primeiro é uma criação do estúdio italiano Bertone encomendada pela marca chinesa; o segundo, um trabalho conjunto entre os designers da Fiat no Brasil e na Itália. Mas, além do design “diferente”, os dois têm em comum características voltadas ao uso urbano, com direção leve e desempenho – e consumo – bastante modestos.

O Uno, um pouco maior e mais espaçoso, parte de R$ 27.860, “pelado” e com motor 1.0. Já o modelo das fotos, com direção hidráulica, vidros dianteiros e travas elétricas, limpador, lavador e desembaçador do vidro traseiro, pneus 175/64 R14 (com roda com calotas), faróis de neblina e predisposição para rádio, sai por R$ 31.147 (SP). Menos pelado, mas ainda bem incompleto. Por muito pouco mais, R$ 31.900, o Face chega com quase tudo a que se tem direito, incluindo airbag duplo, freios com ABS e sensor de estacionamento (leia tabela de equipamentos). Tudo de série. Para se ter uma ideia, um Uno com (quase) os mesmos itens que são oferecidos no Face chega perto dos R$ 39 mil.

Debaixo do capô, o Uno oferece um 1.0 de até 75 cv e 9,9 kgfm, contra um 1.3 16 V de 84 cv e 11,4 kgfm do modelo chinês – números quase iguais aos do Uno 1.4 (que, no entanto, começa em R$ 31.670 – mas aí sem nem os parcos opcionais acima). Aqui, cabem duas observações importantes. Primeiro, o desempenho do Chery, apesar das especi cações, ca mais próximo do Fiat 1.0 que do com motor 1.4. Segundo, o Uno é ex e o Face não. Dependendo do preço do etanol na sua região, isso pode ser um problema.

Nenhum dos dois é perfeito. A espuma dos bancos do Face falha no suporte e incomoda coxas e costas. No Uno, a alavanca de câmbio insiste em se chocar contra a lateral do assento ao se engatar a segunda e um “farelo” de borracha vazava pelas saídas de ar nesta unidade avaliada. No Face, por outro lado, o espelho de cortesia do passageiro estava se descolando do quebra-sol e a costura de um dos bancos estava soltando.

O Chery tem um incômodo “buraco” entre a terceira e a quarta marchas, mas o ruído do motor na cabine – que chega a incomodar no Uno, principalmente na estrada, acima dos 100 km/h – não se ouve no silencioso chinês (graças ao uso e abuso de borrachas para isolamento acústico nas molduras das portas e ao redor da tampa do motor). Interessante no modelo chinês é o descanso na pedaleira, que normalmente equipa apenas modelos com câmbio automático e serve para apoiar o pé esquerdo em viagens longas.

Na hora em que se fala de uma marca nova, seja ela americana, seja japonesa, chinesa ou afegã, surgem as preocupações em relação à garantia, aos custos das revisões e da manutenção. Os executivos da Chery sabem disso, e também do preconceito que existe contra os modelos chineses. Por isso, oferecem três anos de garantia total e assistência 24 horas (enquanto o Fiat tem só um ano de garantia). Mas fomos atrás, também, dos outros custos. No seguro, uma surpresa: o Face tem cotação até um pouco mais baixa que a do Uno na (leia tabela com per s e preço de franquia).

O Fiat tem revisões obrigatórias a cada 15.000 km (sem limite de tempo). Mas óleo e ltro de óleo, caso não se atinja esta quilometragem em um ano, devem, de qualquer forma, ser trocados. Além disso, concessionárias consultadas em São Paulo “recomendam” revisões adicionais – com troca de óleo, ltro de óleo e ltro de combustível – nos intervalos (com 7.500 km, 22.500 km, etc). Isso porque consideram o uso na cidade como sendo “severo”. Por essa razão, na tabela de revisões as incluímos (com preço médio nas concessionárias consultadas), embora não sejam parte do plano de revisões o cial da marca. Caso seu uso não seja severo, dá para eliminá-las sem perder a garantia (cerca de R$ 350 a menos nestes primeiros 30.000 km).

Já o Face tem a primeira revisão obrigatória com 2.500 km e as demais a cada 10.000 km ou um ano. Assim como o Fiat, tem revisões com preço xo, mas elas são mais caras e não tão xas assim (houve variação entre as concessionárias consultadas). Fazendo as contas, em 30.000 km você vai gastar entre R$ 545 e R$ 897 a mais nas revisões obrigatórias do Chery – uma diferença irrelevante, considerando que não representa nem uma pequena fração do valor dos itens de série que você deixa de ter ao optar pelo Uno.

Se o Face vence de lavada em equipamentos, preço e garantia, o Uno leva vantagem no motor ex, no espaço para bagagem, nas revisões (mas só se destaca, consideravelmente, para o motorista que faz um uso leve do carro), no número de concessionárias, nas suspensões e na direção. Se você decidir aceitar as pancadas secas da suspensão traseira com eixo rígido do chinês e seu volante leve demais na estrada em troca do ar-condicionado, dos airbags e do ABS, entre outras coisas (e dos mais de R$ 8 mil a menos, comparando com um Uno completinho), o Face pode sim ser uma boa compra. A única dúvida é em relação à desvalorização que deve ser maior que a do Fiat.

Despido de qualquer preconceito, minha conclusão, portanto, é de que o chinês com design italiano é um belo adversário para o brasileiro de marca italiana e design ítalo-brasileiro. Não que o Chery seja perfeito, ainda há pontos que devem ser melhorados – mas o Uno também não está totalmente livre de críticas. A questão-chave é o que cada um deles oferece por seu dinheiro. E é aí que o Chery Face leva uma bela vantagem.

O espaço não é tão bom e as pernas sofrem. Em compensação, o silêncio é destacável. A espuma dos bancos é ruim, mas há muitos itens de conforto e segurança

O aproveitamento de espaço se destaca, mas há problemas como a alavanca de câmbio que raspa no banco ao engatar a segunda. O acabamento é pouco superior