Ainda faltam duas semanas para terminar o ano, mas quase tudo já está decidido no mercado brasileiro. A Chevrolet está disparada na liderança de automóveis de passeio (96 mil carros à frente de sua rival mais próxima) e a Fiat deu um banho no segmento de comerciais leves (63 mil veículos de vantagem sobre a segunda colocada). A única posição importante em disputa é a vice-liderança nas vendas de carros de passeio. Em novembro, a Hyundai tinha 3.422 unidades à frente da Fiat – um fato histórico para a marca coreana, se essa colocação for confirmada.

Na soma dos chamados veículos leves, a Chevrolet emplacou 309 mil carros e deve fechar o ano com 337 mil, contra estimados 301 mil da Fiat (que tem 276 mil vendas realizadas). Portanto, a GM (General Motors), que é dona da marca Chevrolet, comemora mais um ano na liderança do mercado brasileiro, certo? Não.

Talvez para não ser comparada com a Hyundai, talvez porque levou um ano para que a ficha caísse dentro da própria empresa, a Fiat não quer mais ser vista apenas como Fiat. Ela agora é parte da Fiat Chrysler Automobiles (FCA). Não que já não fosse desde o final de 2014, mas só agora, no finalzinho de 2016, a FCA está enfatizando que é a verdadeira líder de vendas do mercado brasileiro.

Como marca, ainda é a Chevrolet, o braço mais famoso da gigantesca General Motors Corporation. Mas, como a Chevrolet é a única marca da GM no Brasil, a empresa número 1 passa a ser a FCA. Aliás, não passa. Já era desde o ano passado. Afinal, em 2015, a FCA vendeu 480 mil veículos leves, enquanto a GM emplacou 331 mil. Mas, curiosamente, pouca gente deu importância a esse fato. Números e motivações à parte, o que realmente importa é o que muda na prática com a união das marcas Fiat, Chrysler, Jeep, Dodge e RAM (para citar apenas as que estão presentes no Brasil, pois há outras, como Alfa Romeo e Lancia).

Segundo Sergio Ferreira, diretor comercial da FCA, perder a segunda posição entre os carros de passeio para a Hyundai “não incomoda, porque o nosso objetivo era recuperar a rentabilidade da empresa”. Ele aproveita para destacar que a FCA é líder dos três nichos mais importantes do mercado atualmente: hatches compactos 1.0 (o de maior volume, representando 40% das vendas totais), SUVs (o que mais cresce, com aumento de 14,9%) e picapes (também em forte alta de 13,2%).

No segmento AB (hatches compactos), a FCA ainda conta com a força da Fiat. Apesar da perda de 224 mil vendas desde 2011, a liderança da marca chegou ao sexto ano consecutivo. “A Fiat caiu muito porque sua base era muito alta”, comenta Marco Antonio Lage, diretor de comunicação corporativa da FCA. Outras grandes também caíram, enquanto a Hyundai cresceu. Para Sergio Ferreira, os modelos Palio, Mobi e Uno vão garantir a liderança da FCA entre os hatches 1.0 na próxima temporada.

É a Fiat que também garante a liderança entre as picapes, com os modelos Strada e Toro, os dois mais vendidos do Brasil. Por isso, os 559 concessionários Fiat não teriam motivo para ter ciúmes dos 191 da Jeep, que comercializam os utilitários esportivos  Renegade e Compass. “A rede Fiat foi concebida para um mercado de 4 milhões de carros e hoje estamos com 2 milhões, mas as picapes Toro e Strada compensam a queda no segmento AB e fazem com que os concessionários ganhem dinheiro”, explica Ferreira. Mesmo assim, a rede foi enxugada em 30 concessionários. No total, a FCA tem 750, sendo 191 revendedores Jeep (dos quais 47 vendem também as marcas Chrysler, Dodge e RAM).

Mas é a dupla Renegade/Compass, da Jeep, que deverá garantir ainda mais rentabilidade à FCA no Brasil. A empresa acredita que o segmento de SUVs, que subiu de 6,2% para 14,9% de participação no mercado desde 2010, vai crescer pelo menos até 20% (média mundial), podendo superar esse índice. Por isso, já em 2017 a marca Jeep deverá superar a Honda (que tem no HR-V o modelo mais vendido da categoria). Na média do ano, a Honda tem 19,9%, contra 19,5% da Jeep. Mas, nos primeiros 15 dias de dezembro a Jeep já tinha 24,5% contra 16,2% da Honda.

Mesmo com a entrada de novos concorrentes, como o WR-V, da própria Honda, o Renault Captur e os novos Tucson e Creta, da Hyundai, a FCA acredita que ficará na frente em 2017. “Antecipamos em um ano os planos de liderança da marca Jeep para o segmento de SUVs, que tinha como objetivo 2018”, comemora Ferreira. A chegada dos rivais citados, bem como o aumento de produção do Nissan Kicks e a renovação do Chevrolet Tracker, irão apenas reduzir a participação das duas marcas líderes, mas não alterar a relação de forças ou o volume de vendas. Atualmente, a Honda e a Jeep dominam amplamente o mercado de SUVs.

Por causa de todos esses movimentos, os brasileiros devem se acostumar a olhar para a Fiat de um modo diferente. “Estamos fazendo um reposicionamento da marca, que antes era vista apenas como a que vendia os carros mais baratos”, comenta Marco Antonio Lage. “A Fiat passará a ser vista como fabricante de produtos com alto valor agregado.” A estreia global dos motores 3 cilindros 1.0 no Uno e no Mobi faz parte desse movimento. Com o novo motor, o Mobi ganhou agilidade e economia, tornando-se bem mais competitivo, e já bate na casa das 4.000 vendas/mês.

Mas a Fiat irá além. Segundo Lage, dois novos produtos serão lançados no Brasil em 2017. Pelo que já sabemos, trata-se de um hatch médio para ser fabricado em Betim (MG) e de um sedã médio para ser fabricado em Córdoba (Argentina). Os carros estão sendo desenvolvidos com os codinomes X6H (hatch) e X6S (sedã) e são baseados na nova família Tipo, da Fiat italiana. Mas as modificações são tão grandes para o mercado sul-americano que talvez eles nem mantenham o nome Tipo (que já foi usado no Brasil). O X6H e o X6S devem ocupar o lugar dos atuais Punto e Linea no mercado brasileiro.

Finalmente, não para fazer volume, mas para participar de um nicho de mercado, a FCA estuda trazer dos Estados Unidos alguns sedãs da Chrysler e da Dodge. Nesse caso, eles tanto poderiam ter a marca original como ganharem o logotipo Fiat, como já é feito com o Dodge Journey (Fiat Freemont aqui) e com a Fiat Strada (vendida como RAM no México). Mas isso dependeria de uma grande reação do mercado.