Neste ano, a indústria automotiva brasileira deve cravar um recorde: até o começo de julho, já haviam sido realizadas 29 convocações de carros, motos e caminhões para recalls – e há grandes chances de que a marca histórica do ano passado (foram 35 convocações) seja batida este ano.

Se considerarmos o total de unidades convocadas, o número já foi maior. Mas pior que um recall de muitas unidades de um modelo são recalls de um número maior de modelos.

Quando um carro sai de fábrica com um defeito e a fabricante o assume – voluntariamente ou não – é hora do recall. O consumidor não paga pelo reparo e, na maioria dos casos, evita riscos para sua segurança. Basta comparecer a uma concessionária.

Mesmo assim, o índice de atendimento ao chamado é baixo. Segundo o DPDC (Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor), órgão do governo ligado ao Ministério da Justiça, entre 2000 e 2009 só metade dos recalls de automóveis tiveram alto índice de comparecimento (acima de 70%). Um projeto de lei recente quer bloquear a transferência do veículo que não compareceu ao recall, mas ele ainda não foi aprovado.

Con ra as principais respostas sobre o procedimento, com informações da consultora técnica do Idec (Instituto de Defesa do Consumidor) Renata Faria, para quem “o recall é um dever da empresa e também um direito do consumidor”.

Por que tantos recalls têm sido realizados?

Além do aumento na produção e venda de veículos no País, a maior utilização de simulações por computador no desenvolvimento dos modelos também pode ser responsabilizada. Com menos testes práticos, muitos problemas aparecem depois que os carros estão nas ruas.

Qualquer problema em um modelo motiva o recall?

Não, eles são realizados apenas quando há risco à segurança dos proprietários. Caso não represente esse risco, a montadora não é obrigada a realizá-lo – e o consumidor, na maioria das vezes, tem que procurar uma concessionária e negociar o conserto.

Há prazo para o comparecimento do cliente à concessionária?

Não. A partir do momento em que o carro é chamado para o reparo, o consumidor pode comparecer quando quiser para solicitar o serviço.

Fiz um reparo em um defeito no meu carro, e depois foi anunciado o recall para o mesmo problema. Tenho direito ao reembolso do valor que gastei?

Sim. Renata explica que “caso o consumidor já tenha experimentado algum dano decorrente do uso de algum produto defeituoso, anteriormente ao chamamento, deverá buscar as vias judiciais para o devido ressarcimento”.

Moro longe da concessionária, e tive que perder um dia de trabalho para levar o carro à autorizada. Tenho direito a indenização? Como proceder?

Segundo a consultora do Idec, “se o consumidor sofre dano em razão do defeito do carro (não teria de atender ao recall se não houvesse defeito), o fornecedor responde pela reparação. O consumidor tem cinco anos para reclamar perante o fornecedor”. Caso tenha dificuldade, deve procurar os Procons estaduais ou municipais – e, em último caso, as vias judiciais – para o ressarcimento.

Comprei um carro usado que depois foi chamado. Tenho direito a fazê-lo?

Sim, e deve. “O produto ou serviço são objeto do chamamento, independentemente de quem seja o proprietário no momento do recall”, explica Renata.

Comprei um carro usado que passou por diversos recalls. Como saber se os devidos reparos foram realizados?

Um projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados (e não aprovado por enquanto) prevê que após a realização dos reparos os fornecedores emitam um comprovante de realização de procedimento técnico-reparador ao proprietário e comunique ao Denatran o chassi do veículo reparado. Segundo o projeto, sem o comprovante o carro não poderá ser licenciado e não poderá ser transferido para outro proprietário no caso de venda.

Qual a fonte mais recomendável para conferir os recalls de um determinado modelo?

A consultora do Idec informa que “o DPDC mantém um sistema on-line de consulta de recalls desde o ano 2000 (http://portal.mj.gov.br/Recall)”. O consumidor pode veri car se um determinado produto está sendo objeto de recall.

Como saber qual o perigo real do problema? No caso de um carro com problema no freio, o cliente deve ter medo do risco que corre ao se dirigir até a concessionária? A marca busca o carro na casa do cliente? A montadora, ou alguém, divulga estatísticas dos acidentes que já ocorreram devido ao problema?

Renata diz que “o Idec não tem conhecimento de estatísticas dos acidentes ocorridos devido ao problema divulgadas por montadoras. No chamamento, os anúncios devem informar sobre o defeito que o produto ou serviço apresenta e sobre os riscos decorrentes”. E acrescenta que, “no caso de problemas que impossibilitem a utilização do veículo, ou o risco seja grande – alta probabilidade de acidente –, é razoável a pretensão do consumidor que a montadora proceda à remoção do veículo”. Essa solicitação deve ser feita à autorizada por escrito para, no caso de um acidente, ser usada como prova em um possível processo.